segunda-feira, outubro 30, 2006

DESCANSO

(…) Rasgava o céu como se tivesse a força de mil homens, noutro ponto do planeta a força da natureza fazia com que os peixes (salmão) subissem o rio contra a força de uma vida.
Por todo o lado a vida corre, sem sentido obrigatório mesmo que seja esse o destino, a ultima paragem de um percurso que ninguém ousa pensar. Basta sincronizar o sentido que nega muitas vezes a razão do razoável.

- Que tempo, esta brisa que me corre pelo corpo, faz sentir-te. O meu corpo fica arrepiado, é como sentir um enorme espasmo, a erupção por todos os poros da minha testosterona.

Lá longe onde o céu era rasgado o tempo estava parado, entre o pensamento e o sonho. Aquele que iria decidir o que poderia naquela altura, naquele espaço de tempo rasgar o céu. – Uma seta? – Um pássaro?! Algo poderia rasgar o Céu, algo que poderia mudar o destino, e muitos sentimentos.


Sem tempo de respirar sentiu seguido de um pequeno zumbido, cravar-se-lhe na carne um pedaço de metal afiado, não conseguiu se quer apreciar a sua morte, não viu como era bela aquela seta, feita de penas de falcão, uma peça delicada.





Noutro espaço de tempo, lá longe… um falcão rasgava o céu, com todo o seu esplendor, um peregrino por excelência, rápido como mais nenhum ser vivo, um predador alado.
No seu voo a uma velocidade vertiginosa, procurava o seu alvo, que afinal não passava de mais um braço amigo que lhe iria roubar duas ou três penas para serem colocadas quase religiosamente naquela flecha que um diria iria cruzar os céus.

- A minha imagem por excelência: - Um enorme furacão, com ventos vertiginosos, no meio daquele redemoinho, Eu, Eu sentado de pernas cruzada, com as mãos pousadas, sobre os quadris, de olhos fechados, inspirando com uma enorme força até sentir a barriga a colar-se as costas. Depois, expirar e afastar todas aquelas nuvens escuras e sentir o céu cor de laranja abrir-se para eu desaparecer entre ele como um raio de luz.

É verdade, nada sobressai naqueles dias cinzentos onde o cansaço é demasiado incompreensível, as dores são demasiado previsíveis, os momentos curtos, ora de desespero, ora de esperança. Mas são momentos, pedaços de tempo que não sabemos se os vamos tornar a ter.

- Tenho um desejo.

Se o vento naquele dia tivesse soprado numa outra direcção aquela seta, ou flecha, poderia ter-se cravado no chão apesar de rasgar o céu com a força de mil homens.


Apeteceu-me


"Por vezes um pouco ao lado pode ser fatal!" Charles de la Folie

segunda-feira, outubro 16, 2006

Sentença

(…) Rodopiava entre o seu próprio silencio. A sua imagem projectava-se no seu próprio espaço, na ruptura entre o seu estado estático e a velocidade do seu rodopiar. A sua vida sempre foi um contra-senso, mas isso não significa que a sua vida seja uma mera forma de estar e de viver.
O pronunciar das suas formas é uma circunstância do que de bom existe na vida. Cheirar aquelas formas sensuais que se desabotoam na nossa imaginação, sugerem-nos fantasias que nos percorrem ao longo das nossas várias etapas, mesmo que sejam pequenas etapas entre a solidão dos nossos passos e a imensidão dos nossos sonhos.
Serão sempre nossas, todas aquelas partes que escolhemos para nos acompanhar.
Ali estava como se de um modelo tratasse, mas a espera de ser modelada, com contornos salobros e de desdém, intocável. Estava apanhada noutro contra-senso, a vida é assim um enorme contra-senso em contra-ciclo com tudo.



Um dia, numa tarde chuvosa, em que o vento nem sequer soprava, reparei:
Num corpo, numa roupa, numa imagem, em varias cores em muitos tons.
Reparei essencialmente numa coisa, ou em duas:
Como é simples apreciar um corpo e como é belo sentir esse corpo pelo seu odor.
Os cheiros fascinam-me a alma, conseguem que ela se arrepie de o esculpir.
Foi nesse dia em que apesar da chuva e do vento que não corria senti uma onda de calor abalar os meus sentidos, as pernas dobraram, os joelhos adormeceram, foi uma queda desamparada. Foram mesmo os joelhos os primeiros a embater na terra, os braços já inertes ao invés de ampararem o trambolhão, foram mais outros a embater violentamente, o peito quase que rebentou tal a força de tal desequilíbrio hormonal. A cabeça, bateu a primeira vez onde descolou os cabelos que estavam de forma alinhada colocados para a direita, o sangue saiu quase de imediato, com a força do embate a cabeça levantou e teve um segundo embate onde varias gotas de sangue saíram em forma de pasta de terra ensanguentada.
Estava ali prostrado naquele dia a ver-me cair sucessivamente. Enquanto as ondas de cheiros chegavam cada vez mais forte.
A verdade é que Ela é linda, sistematicamente linda, morfologicamente apetecível, incrivelmente sugestiva nos seus apetites e na forma de se dar a conhecer. Aquela queda só era possível de vislumbrar enquanto os olhos se vidravam em pensamentos tão nítidos que quase previam a minha queda num futuro próximo. Era num pedestal que talvez ela deveria estar ou numa redoma de cristal, para nunca mais de lá sair. Ao contrario disso estava fechada nos meus pensamentos que circulavam a uma velocidade quase estonteante onde o principio e o fim estavam colados quase que de imediato.
Mas lá estava Ela a rodopiar sobre o seu próprio silêncio. Nos poucos momentos de lucidez emocional, o pensamento fugia dali procurava o verde de uma água desconhecida e o azul de um céu infinito que se projectava a velocidades pouco prováveis nem mesmo sob alçada de uma imaginação abundante em acontecimentos de larga visualização. Estava difícil criar algo de muito belo, mas esse é o princípio... criar sempre algo de belo e transporta-lo para algum lado, nem que fosse aquela tela já tão gasta de tanta cor absorver.
Estava assim sentenciada aquela maldição de todos os dias criar, mesmo que fosse em falso, antes de chegar ao cadafalso.


"Ajudava-me saltar de mim próprio mesmo que em andamento." Charles de la Folie

terça-feira, outubro 03, 2006

Segredo

(…) Quando olhei, nada vi, mas a verdade era inquestionável!
Senti os seus lábios quase a roçar a minha orelha, sopravam palavras que perfumavam a minha imaginação.
Há imagens de sedução que raramente esquecemos, como pequenos sinais e pequenas diferenças que no dia a dia nos fazem grandes mossas. Era um segredo, aquelas palavras faziam todo o sentido, mas ao mesmo tempo desconcentravam-me e desorganizam-me toda a lógica do que era soprado… de um raciocínio que era para ser guardado.
Excitava-me só de pensar que aqueles lábios poderiam descontrolar aquele meu ar sério que gostava de ter, que exigia de mim ter, que gostava de ter para me diferenciar de todos os outros. Mesmo assim era eu que ali estava, meio destabilizado, com o meu metabolismo completamente alterado e alternado.




Aquela pequena aragem que saia da sua boca, provocava-me arrepios na alma, tornava-se numa enorme tempestade dentro de toda aquela postura já de si muito debilitada, enfraquecida pela sua própria mentira.


No fundo era, sim eu no fundo era um ser frágil. A velocidade que o sangue percorria todas as minhas veias e artérias era alucinante, a capacidade do coração bombear a um ritmo fora do comum era presságio de uma catástrofe dentro de todo meu sistema nervoso. As palavras tornavam-se num som empastelado e distorcido demasiado grave para ter melodia.
Pela primeira vez senti o meu corpo imóvel, todo o seu exterior estático enquanto por dentro a ebulição continuava. Estava sentado, numa pequena cadeira, estava de braços cruzados, a mão direita descansava ao longo do músculo do braço esquerdo enquanto, no outro lado se dava o inverso era o músculo que descansava sobre as costas das mãos.
Os pés cruzavam-se no artelho. A cabeça estava reclinada para trás amparada por aquela parede enorme pintada a caliça. O cheiro era de Outono, cheirava a terra molhada, o ar pesado, estupidamente pesado. Estava ali de olhos fechados a tentar entender todos aqueles sons que estava a ser bombardeados para dentro de mim.
De repente algo me fez sair daquela posição imóvel, fiquei pálido. Finquei os dedos nos braços da cadeira, por momentos pensei que ia ficar ali prostrado, aquelas palavras pareciam tiros em direcção a nada…
Eram palavras esclarecedoras de coisa alguma, até porque teriam de morrer comigo ou não fosse um segredo. Mas continuava a espera que aquele segredo continuasse pela vida a fora.

Apeteceu-me

"Posso sempre esconder-me entre as minhas palavras." Charles de la Folie