sábado, novembro 29, 2008

O Gosto a sangue dos meus lábios.


(…) Entranhava-se – vinda não sei bem de onde – uma sensação que se ia perdendo em detrimento daquele vazio perfeito. Numa mão a vontade de dar, na outra a vontade de tirar. Tornava-se demasiado perfeito negociar aquele pedaço de qualquer «coisa» parecido com nada. Um refúgio demasiado elegante para alguém o querer percorrer sem o saborear. Como um enclave, dentro das pregas da sapiência.



(…) Viveu demasiado tempo dentro da sua própria sombra, para se lembrar fosse do que fosse. Foi isso que lhe provocou a violenta metamorfose que o transformou na sombra que o perseguia. Os braços soergueram-se lentamente, a cabeça tombava em círculos e, tudo se manteve escuro. Nem os gemidos da sua própria erosão o demoveram, revelou-se e partiu.


(…) Um arrepio na espinha provocou-lhe aquele olhar perdido, sem expressão e sem chama. Procurava nas palavras que não saíam, a verdade. Caiu fulminado pela ilusão que se refugiava dentro de si. Alojava-se dentro de um parasita num local ermo dentro de si. Nem a melodia perdida dos sons graves da música lhe indicavam o caminho, era noite e chovia.


(…) Os dedos não paravam de baloiçar, numa energia sem precedente. Uma realidade cruel, ao mesmo tempo reconciliadora com o «processo»; reagiam assim, só isso. Estava cinzento o corpo tombado perto de ti, reflectia os pequenos silêncios que se acumulavam, como malmequeres tombados numa batalha longínqua e vegetante.


(…) Não me lembro do teu nome – e isso importa? Não me lembro do teu sorriso – isso parece grave! Como é grave não saber o sabor das palmas das tuas mãos. Nem a cor, nem de cor, do respirar que me mantém acordado, numa vida que se vai esvaindo, dia após dia. Reinvento-me, nada sobra dentro de mim, só o sabor a sangue dos meus lábios.


"Há sequências de nós que nunca chegam a existir". Charles de la Folie

quarta-feira, outubro 29, 2008

Não me lembro de ti, nem de mim

(...) Qual papel de donzela, limita-se a ser, somente isso. Na vida os papeis são distribuidos por nada de concreto. São simplesmente e por aí não há discussão. As sombras perdiam-se numa imensidão crua, sem que o destino tivesse nelas mãos. Isso provocava uma cegueira controlada, não se vê o que não se quer. Da mesma maneira que te escondes quando passas por mim, hoje deixaste que o dia te visse e não te perdeste, nem te refugiaste dele.

(...) Foi um salto felino aquele que vi na escuridão, da tua mente. Pregou-te uma partida, eu sei. Como sei que a verdade que me escondeste não sabia a nada, como a àgua. Só não percebo porque dentro de mim ainda sinto sede. Não só também medo. Continuas nessa sombra escondida, vejo o teu corpo transversalmente cortado ao meio, pela luz. És tu eu sei. Como sei o que é olhar para nada e desejar-te.

(...) As unhas cravaram-se no chão, foste puxada para um além distante – em ti tudo é distante é verdade. Confessas que estavas lá, só não me lembro desse local geométricamente desenhado por ti. Também não me lembro de ti. Desculpa, também não me lembro de mim. Choro pela minha alma que nem sequer sei se existe.


(...) Segredaste-me que afinal te lembravas. Só não me lembro do que te deverias recordar. As tuas palavras souberam-me a silêncios perpétuados em pequenos quadrados, recolhidos de lugares nenhum. No meu mundo já não há lugares, deixaram de existir. Nada existe o mundo ficou branco, provocado por uma espiral de desespero. Afinal lembro-me que o que querias dizer, pediste-me para partir e eu quebrei o silêncio e gritei.


“As palavras proferidas nem sempre têm o mesmo significado quando escutadas:” Charles de la Folie

quinta-feira, outubro 09, 2008

Canto de mim

(...) Quando descobri o teu lado vazio, dormia pelo menos há mil anos. Não me recordo do teu aspecto, da cor dos teus olhos, do teu cabelo, nem sabor dos teus beijos. Lembro-me apenas do teu cheiro – uma pequena brisa de volúpia em tons carmim – diferente de todos os outros que alguma vez presenciei olfativamente.

(...) Aquelas mãos macias não podiam ser minhas – as minhas estavam atadas –, tinham que pertencer a alguém perdido entre a vontade e o desejo. Suaves e doces como o mel, recolhido da sua própria vontade. Mantive dentro de mim a vontade de lhes tocar, não tive coragem de lhe pedir que me acariciasse no meu leito de morte.

(...) Vi nitidamente a cor do teu odor – uma transparência irreal, presa na minha imaginação -, um tom pastel, sublinhado a carvão. Na realidade não me recordava de ti. Sentia a tua presença naquele vazio transposto por mim. Nem sequer entendia esse vácuo, a diferença entre o mutismo gerado à volta do que eu pensava sermos nós, puro engano. Estavas sozinha.

(...) Não consegui prever a minha morte, mas ali estava estático perto de ti. Sentia o teu respirar, como um ciclone que transpunha a minha barreira ilusória. A lágrima que se desprendeu do teu rosto, tocou-me fundo e ecoou durante uma eternidade. Muito mais que aquele ranger de dentes durante a paralisia do meu fenecimento. Irreal dentro de um mundo real e fingido. Será sempre assim, mesmo que não me lembre.

(...) Percebo agora a tua mensagem quando escreveste: “Leio-te pungentemente, até que a morte nos separe”. E depois lembrei-me, e se lesses as mensagens ditadas pelo meu corpo. São telegrafadas em pedaços de satisfação. O corpo rasga-se delicadamente sob a incidência do teu olhar e ali fico. Posso perguntar por ti?


Apeteceu-me

“Nem sempre o sonho é corrompido pelo acordar mais longo da nossa vida”. Charles de la Folie

terça-feira, setembro 09, 2008

Papel de parede

(...) Soltei aquele grito caracteristico de gente crescida – de uma forma lancinante – na penumbra daquele local. Não era a imagem que tinha de ti, perdido num qualquer local que não davas conta. Passei-te a mão pelo cabelo, senti aquele suor frio - que se escapava da testa - ficar agarrado às minha mãos. Quando olhei de uma primeira vez, vi sangue – não podia ser, era frio – depois de olhar outra vez, era apenas a minha mão.


(...) Diz-me só mais uma vez, só mais uma. Gosto das tuas palavras, da forma como as entoas. Percorrem-me os sentidos e descobrem-me emoções que pensava estarem inutilizadas para sempre. Só mais uma vez diz-me qualquer coisa para poder redesenhar-te dentro da minha alma. Como se estivéssemos numa cama – deitados e juntos – perdidos em silêncios.


(...) Não acredito que não sejas o homem que conheci – hoje prostrado dessa forma pérfida. Crescente dentro de mim e fizeste-me crescer para sempre. Não me lembro bem ao certo quando foi – a memória trai-me da mesma forma que fui traido por ti. Já nem esse sorriso te descontrai e deixa esse dilúvio de disparates desvanecerem-se. Acorda ainda pertences a este mundo – eu sei do que falo.

(...) Enquanto pensava nas palavras que não ouvia, reflectia nos movimentos do Mar – na perpetuação da nossa incapacidade de resistir. Soltei-me com se fosse uma fúria, na direcção exacta do passado. Lembro de bater em vão – com força – num vazio desconcertante. Já não estavas lá – senti o teu paladar – quando percebi que nunca lá tinhas estado.

(...) Das vezes que te vi, não eras tu, nunca foste. Nem as palavras foram - disparadas – por ti. Não existes eu sei. Já eu fui vetado a estar aqui eternamente, escondido em cada palavra que me sai – é isso eu sei. Morro de medo, só de saber que ninguém me entende.



Apeteceu-me

"Dentro de ti re-descubro-me" Charles de la Folie



quinta-feira, julho 31, 2008

Lado de fora


(…) Não havia memória, nem o desejo de recordar fosse, o que fosse. Naquele dia, naquela localidade onde a chuva deixava aquele cheiro a terra molhada; onde as nuvens de cor pérfida, perdiam-se na mesma direcção do vento. O ruído longínquo dos trovões assustavam, os relâmpagos faziam-me rever no meu reflexo, enquanto espreitava a rua pela janela. Os vários suspiros embatiam e embaciavam o vidro, numa tormenta exacerbada. Com o polegar, forçava o anelar, numa luta desigual, era a maneira de sentir que ali estava. Trincava o lábio superior com a violência de quem beija «apaixonadamente».

(…) Lembrei-me dela novamente – as lágrimas corriam de forma quase simétrica pela face. Na verdade nunca me esqueci, nem podia, sempre fez parte de mim. Como poderia não recordar cada momento, o som do respirar, a música do seu olhar, o calor do seu abraço ou a verdade do seu pensamento. Estava ali – mesmo ao meu lado – sentia o seu sibilar entre dentes, como quem impões a sua presença. Quando olhava, via apenas um vazio, até descobrir que podia realmente enxergar – bastava para isso fechar os olhos e depois abri-los e lá estava, como sempre ao meu lado.

(…) Se as palavras tiverem algo para nos dizer, bailam no nosso pensamento. Contento-me quando ouço os segredos da vida relatados pelos vários sorrisos da minha existência. Lembro-me do som que o beijo deixa, aquele zunido que se arrasta dentro do nosso ouvido e nos oferece uma arrepio – bom – pela espinha. Aquele cruzamento vago que percorre e nos enche a alma, voltou de novo, está aqui perto, sinto-o.

(…) O barulho do bater do coração, faz-me olhar na direcção exacta do que quero ver. Como se os dias tivessem catalogados em imagens e se desfolhassem como os livros. Assim via-te sempre que precisava de te chamar, nem que fosse só para sentir aquele perfume a éden que trazias agarrado a ti. Rodopiava com a volúpia da ternura. Precisava da tua mão.

A imagem "http://tn3-2.deviantart.com/fs8/300W/i/2005/320/b/9/o_outro_lado_do_espelho_by_destroyd.jpg" não pode ser mostrada, porque contém erros.

Apeteceu-me

"A noite fica sempre do outro lado, mesmo que esse seja o teu lado". Charles de la Folie

sexta-feira, junho 27, 2008

Páginas Soltas


(...) Não me lembro ao certo, qual foi o dia da semana, seria domingo ou segunda-feira. Na realidade isso não me importava grade coisa – não me sentia com a vontade de outrora – mas afinal só tinham passado dois dias depois de a ter visto. Vestia simples e simplesmente caminhava rumo à minha imaginação.

(...) Certamente que não era real a imagem que havia chegado até mim. Ninguém pode ser assim tão perfeito. Aqueles contornos de personalidade, assentes num espirito quase livre e sem preconceitos que vagueavam nas ondas produzidas num oceano de ideias. O bafo que saia de sua boca era doce – como nada.

(...) Tinha um olhar sem expressão – não é verdade, mas gosto de esborratar essas palavras na minha tela preferida. São as cores da frase que me afagam a vontade de te ver e ficar parado a olhar para esses fragmentos da minha imaginação. Vejo-te esboçar um sorriso, mas só isso, não passa de um esboço de cor indefenida como estas palavras.

(...) Onde estava ela quando perguntei pela verdade dos sentimentos. Escondeu-se dentro daquela tela onde os verdes do campo sobressaiam, na esperança que o azul do céu não fosse atravessado pelo branco das nuvens. Tudo é cor, mesmo quando a dimensão do surreal se atravessa na «minha» direcção.

(...) O que foi que disseste? Sussurraste tão baixo que tenho dificuldade em descobrir-te. Existes mesmo? É verdade espanta-me como te podes esconder num dia como este. Afinal não é dia e a noite tarda em chegar – estamos no limbo, entre a vontade e o desespero de gritar – solta-o.

(...) Já não me lembro se foi ontem, não me lembro se eras tu - ela, se era ela – tu. Faz diferença pensar isso de ti – foi o que pensei, desde que se pense, não tem importância. Mas onde se pode transportar esse cogitar – nunca vi isso assim, nem mesmo no dia que saltei do cadafalso, solto de ti.

Apeteceu-me

“Quando abri os olhos apercebi-me que não foi um sonho, afinal só tinha passado mais um dia”. Charles de la Folie

quarta-feira, junho 04, 2008

(A)Deus a Fé de (a)mar

(...) Percorria o silêncio em que me encontrava em busca de uma palavra, de um sinal, de uma ilusão. Nada, naquele dia só o desespero das imagens em agonia me despertavam daquela intensa apatia - repetitiva. As palavras surgiam em pequenos murmúrios sentidos e discretos – havia a dor.

(...) Da mesma forma que te abraçava procurava nas palavras aquilo que sentia. Rescrevia na atmosfera aquele sentimento tão próprio da paixão. Nada aparecia escrito, havia sentimento no momento e desejo de verdade, mas as palavras – ficavam por escrever.

(...) Nunca o vi, nem sei se alguma vez o verei. Não acredito que se esconda, na realidade não acredito naquilo que não vejo – se não se esconde onde estará? – pergunto. É uma antiga dúvida que segue num movimento quase perpétuo. Uma avalanche de gente procura-o sem dó num movimento inalienável de Fé.


(...) falo dele como quem bebe água, mas não sei nada sobre ele. Provoca dores imparáveis e sem sentido. Percorro novamente o espaço que fica entre corpos, os vazios que não encontro e surgem-me palavras que não se descrevem – nem sei se existem.

(...) De Deus só conheço um imenso adeus – numa despedida cheia de dor. Do amor só conheço o ardor com que se define algo que não se vê. Nem Deus, nem o Amor se vêem, não se definem, nem aparecem – serão eles actos de fé?

“ Um dia perguntei a um anjo: Porque estou eu a sonhar?” Charles de la Folie

terça-feira, maio 20, 2008

Para ti...

Os teus olhos fugiram-me, mas não vou deixar que eles se percam no meu pensamento. Sinto-te a cada passo que dou – o teu respirar tranquiliza-me. Não é justo… simplesmente porque não é – nunca é. Nestes momentos todos nós somos egoístas – porque és minha –, és nossa. Foste só no momento exacto em que acreditaste que podias e que éramos capazes. Somos… preparaste-nos para isso, para sermos competentes. Sinto um aperto, um sufoco e uma vontade de gritar. Tenho saudades… temos.

“Nunca estamos suficientemente preparados para deixar partir.” Charles de la Folie

quarta-feira, abril 30, 2008

As Razões do Nada


(…) As saudades de escrever o que me vai na alma, percorrem-me o corpo. Há um formigueiro nos meus dedos – redescubro as teclas, percorro-as deliciosamente. Resiste um corpo entre mim e o desejo, entrega-se. Minto – denuncia-me. É novo, mas não resiste – nem ao medo, que atravessa a sala – num silêncio discreto e prudente. Fico na quietude de nada – gosto da palavra nada -, e do vazio.



(…) Preencho-te os espaços da tua solicitude – ouço a tua respiração ofegante, entre o olhar do desejo e o desejo de gritar. Finco-me na imaginação de quem não está e de quem não quer – e quem vai? – pergunto-me. - E quem fica? – respondem-me. Nunca descobri onde ficava – afinal – esse silêncio. Senti esse grito a falar do impossível. Nunca.

(…) Essa é uma viagem sem retorno. Essa é uma viagem! Desde quando é que as viagens tem um retorno? A minha mente viaja vezes sem fim na procura de coisa alguma – nada que signifique algo. Mais uma incongruência de palavras. São elas que nos traem. Que imaginas tu? Imagino-te dentro de mim – num círculo de imagens coloridas pelo preto e pelo branco.


(…) Aquele grito incomodava-me… porquê racista. Neste planeta nada existia além do teu enorme ego. Ergo de tais palavras – pensava. Reciclava as palavras – uma atrás de outra, restava o silêncio que criaste na plenitude dos vocábulos que não conseguias articular. Hoje, bem longe de ontem. Hoje, não me lembro de ter beijado.

(…) Procuraste? Caiu bem longe a imagem da tua virtude. Não é central? Sim é – a probidade. Mentes-me, nem por isso – sonho e protejo-me da chuva de inverdades que atiram sobre mim. Raramente te vejo, mas estás aí – pergunto. – Sim estou – respondes-me.



Apeteceu-me

"Ontem ouvi-te silenciosamente, ainda hoje as palavras ecoam dentro de mim." Charles de la Folie

terça-feira, abril 15, 2008

Apresentação - Como Matei o Ministro - Lisboa

Já está... Gostava de conseguir escrever sobre mim, mas as ideias desvanecem-se e prostram-se.
- Como Matei o Ministro - Foi apresentado em Lisboa, numa das suas últimas etapas de maturação -, agora há que o decantar e bebê-lo - calmamente.



Uma "grande" amizade entre nós - Zé e eu.


Um amigo do dia-a-dia - Carlos Silva



Gente Bonita em amena "cavaqueira"



As explicações sobre a "Morte" do Ministro

Apeteceu-me

"Por vezes numa linha paralela os sonhos e os pesadelos cruzam-se." Charles de la Folie

segunda-feira, abril 07, 2008

Depois de Santarém agora Lisboa

A Editora Contra Margem e o autor convidam-no a estar presente no lançamento do livro

- Como matei o Ministro – do jornalista Carlos J. Barros. A obra vai ser apresentada por Paulino Coelho, no dia 12 de Abril (sábado) pelas 17 horas, na Lisbon AD School,Rua Dr. Nicolau de Bettencourt nº 45A, 1050 - 078 Lisboa. ( Frente ao centro de Arte Moderna – CAM – Gulbenkian)




A Sala do Teatro Sá da Bandeira - Santarém



Eu, Paulino Coelho e Helena Mineiro - Contra margem -




Amigos de Sempre



Uma maneira diferente... de " Como Matei o Ministro" chegar longe
Apeteceu-me

" Perante as nossas dúvidas, deveremos avançar ao sinal dos amigos." Charles de la Folie

sexta-feira, março 14, 2008

Convite





Estão todos convidados

Apeteceu-me

"Aprender é o maior de todos os dons, por isso sinto-me um dotado." Charles de la Folie

sexta-feira, fevereiro 22, 2008

...Sem fim

(...) Lembrei-me agora. Lá fora chovia, um cheiro infernal de ti escorria dentro de mim.

Cruzei os braços, sentei-me à tua espera – Pouco ou nada esperava. Não foi por isso que apareci, vim porque queria mesmo aqui estar. Nem sempre é possível, nem sempre quero e nem sempre queres. – Não escrevo estas palavras por me sentir abandonada -, sim abandonada, é assim que me sinto hoje. Nos outros dias não é tão forte, doí, mas não é tão forte. Hoje sinto aquela “coisa” dentro de mim. – Lembras-te de eu te falar! Deixa-me fazer outra pergunta, deixas? – Claro que deixas, não é verdade?! Lembras-te de mim? Das minhas feições, do meu cheiro! Só mais uma pergunta, será que posso? – Alguma vez te passou pela cabeça que gosto do Silêncio. – Não precisas estar calado, sabes que o ruído do teu silêncio magoa. É um contra senso, mas é a mais pura das verdades(...)





Apeteceu-me

"Os sonhos muitas vezes sonhados, não deixam de ser sonhos." Charles de la Folie

terça-feira, fevereiro 05, 2008

“Como matei o Ministro”


Como matei o Ministro será apresentado dia 5 de Abril em Lisboa e a 6 de Abril em Santarém –


Este novo romance nasce de um prazer espontâneo – sem artifícios – que surge ao correr da pena e consoante o meu estado de espírito.


Toda a trama narrativa gira em torno de Carlos A., das suas manias, medos, fobias e da sua obsessão em matar o Ministro das Finanças. “...todos os dias, sem se aperceber tem aquele ritual. Ritual sem ritmo e estrambulhado que acontece há tanto tempo que já quase nada importa. Custa ver-se assim, entre a morte e o estrebuchar para a vida. – Só assim se entende o difícil olhar para a rua, ver todas as manhãs a escuridão em que acorda e se levanta. – Difícil resgatar o Sol na penumbra daqueles olhos semi cerrados! Lógico acorda completamente deprimido a pensar naquela profunda solidão em que vai vivendo.


Carlos A. gosta de se deitar a pensar na sua vida danada e condenada, acorda a pensar de forma positiva - na vida danada e condenada.

“....as injustiças aborrecem-no, é uma das coisas que mais o aborrece. Sabe que a culpa não costuma morrer solteira, não costuma culpar ninguém...

- Ninguém não! Há evidentemente uma pessoa… – O Ministro! Ele que o atormenta há anos. O Ministro com a pasta das Finanças. Esse sim, o motivo dos seus pensamentos menos lúcidos – raramente deixa de pensar nele – uma obsessão….”




Carlos trabalha numa repartição de finanças, é um sujeito “...curioso, aquela cabeça nunca pára – apesar do seu ar, gosta de sonhar, é um sonhador nato. De imaginação cruel, cínica, mas hilariante, de um grande sentido de humor, rasgado por vezes de bafos de ódio. …”

Vive num mundo fechado, muito seu, até ao dia em que se apaixona perdidamente por Ana. “……. Não percebia o que se passava com ele. Toda aquela disfunção hormonal era irracional e incompreensível. Afinal Carlos A. estava apaixonado!...”

Esta força arrebatadora, esta paixão acaba por se impor e provocar em Carlos um desejo premente de mudança.

“……Porque não dizes tu o que gostavas que eu mudasse, que eu comprasse?! – segredou-lhe. Fez um sorriso timidamente malicioso e rematou.Gostava que me mudasses.

Ana esperou muito tempo por este dia, não enrubesceu como seria de esperar, simplesmente sorriu. Os seus lábios ficaram vermelho cereja. Os seus olhos ganharam um brilho especial. O seu corpo começou um diálogo sensual, entre a sua imagem e o seu querer. …”



Há um deslizar sob a superfície revolta do nosso quotidiano. A luta diária, a lufa-lufa da grande cidade, a corrupção, o poder do “grand monde”, a degradação de espaços, instituições… deste país à beira-mar plantado, surgem em pequenos flash.

Grandes valores da vida são abordados sem o recurso a um tom moralizante.

Não esqueçamos ainda o prazer dos sentidos, dos comensais, gastronómicos, dos odores inebriantes da nossa fausta cozinha, dos nossos vinhos… coloridos.



“…. Molharam os lábios mais uma vez com aquela dádiva divina, uma criação que por certo passou pelas mãos de Baco. Pareciam ter medo de beber em demasia, com receio que se acabasse ali o momento. Ergueram os copos em direcção ao céu – saudaram-se, no meio de um tilintar de vidro fino. ….”



“…. O vinho corria pelas gargantas qual prazer de quem escuta e sente música. A comida estava excelentemente confeccionada. Não era “nouvelle cuisine”, nem alta cozinha, era a cozinha do possível, por vezes – uma magnífica cozinha! .... Uma pequena delícia acompanhada com uma oferta, um excelente licor de zimbro fresquinho. Tomaram café, sentiam-se bem com eles próprios. … “



“…. Ali, o peixe do rio era famoso, gostoso, temperado segundo tradições antigas que chegavam de terras longínquas. Mas Ana vinha com vontade de comer uma chanfana. A sua falecida avó é que fazia muitas vezes, ela adorava – carne de cabra, velha de preferência, cortada aos pedaços… toda ela enfiada numa caçoila de barro negro. Muita cebola cortada às rodelas, alho, salsa, banha e vinho tinto do melhor que por aí se encontre, temperado por mãos sábias. Depois, num forno de lenha, cozinhar e embebedar a carne a gosto. ….”



Carlos A., Ana C., Alexandre V. são personagens fictícias, mas bem reais nos seus pensamentos, atitudes e desejos.

Terá Carlos a coragem suficiente para pôr em prática o seu maquiavélico plano –, num pequeno sorriso Carlos encontra o que perdeu outrora.





Apeteceu-me

"É preciso acreditarmos nas nossas paixões menos carnais". Charles de la Folie

terça-feira, janeiro 15, 2008

Linhas…

(…) Há uma linha onde se prende a minha vida. Todos os dias, quando me lembro que sou um sobrevivente, salta-me à memória, o pequeno monitor de hospital, de fundo negro, com uma linha contínua verde solto –, onde surgem os batimentos cardíacos. Ouço os apitos, num som estridente, que penetram pelo corpo e provocam pequenos calafrios. Quando se cala, é de vez, uma vida que se foi, uma alma que resta, muitas historias que se contam.

(…) Estava frio, o céu azul, a água calma e havia um silêncio gritante. Ao fundo uma linha, uma enorme linha, que dividia o finito do infinito. O azul mortal, com o azul celeste. Os olhos cerravam-se deixando uma pequena abertura para que o reflexo do sol na água não me ferisse a vista. Duas ou três gaivotas pareciam paradas no horizonte, mantinham-se numa linha que se formava mesmo ali, perdidas para sempre.



(…) Sentado à janela, via como ninguém o galgar de terra em direcção a mais um dia. Sentia o deslizar do comboio naquela linha de sentido único. Sempre os mesmos lugares, as mesmas paisagens, os mesmos cheiros. A senhora da passagem de nível parecia estar ali plantada há séculos. – Com uma bandeira vermelha, de cor já muito comida de tantos anos naquela posição. Naquela linha, perdera-se há muito –, a pouca terra.



(…) Naquela manhã, ouviu-se mais uma vez o grito ríspido do comandante do pelotão. Estava, frio e enevoado, a humidade caía insistentemente. O corpo cravava-se naquela posição durante tempo demais, os músculos ficavam dormentes, a cabeça deixava de ser racional. As ordens rompiam em ecos muito profundos dentro de um estado de espírito que não existia. Tudo em nome de uma disciplina rígida, para uma guerra que não havia. Em nome de uma linha e de uma linhagem imaginária.



(…) A luta parecia desigual. Durante minutos, largos minutos, ali estava ele, de mão firme. Uma mão no punho da cana, outra no carreto. A cana vergava, entre puxões de parte a parte. O anzol cravara-se na boca do peixe, que lutava desesperadamente pela sobrevivência. Do outro lado com mestria, um estranho bailado na esperança do seu opositor se render -, entre avanços e recuos. Um impasse – a linha parte-se.




Apeteceu-me

"É muito ténue a linha que separa a nossa imaginação da realidade". Charles de la Folie

quinta-feira, janeiro 03, 2008

Não me lembro...


(…) Cruzava-me entre o nada e o tudo. Era dia, não um dia do mês, mas mais um dia numa vida que se queria, entre a esperança e a ansiedade –, de não a ter de desdenhar. Um sorriso, mais um passo no vazio que se preenche com um futuro que rapidamente nos presenteia com o passado. Entrelaçava os dedos, suspirava fundo, tentava esquecer os pensamentos rotineiros das verdades indesmentíveis que não fazem qualquer sentido – só por isso falsas.

(…) De braços abertos à espera de um corpo para abraçar, contento-me com a aragem que me envolve. Descubro bem no fim do meu olhar aquilo a que chamam o horizonte, perfilo-me na sua direcção, mas permaneço imóvel. Só o olhar, numa desenfreada luta com o convencional, o puxa (horizonte) em direcção à minha alma. Espero pelo embate, fecho os olhos e sinto-o a chegar –, mais uma vez dou por mim de braços abertos.


(…) O rio corre barrento, lá dentro milhares de muitos quês e porquês. Está na hora de deixar de pensar. Afinal tudo existe, realmente tudo depende de tudo. O barco que só faz sentido na água, o óbvio que só é óbvio por isso mesmo e a disciplina, só o é pela indisciplina. Cruzo-me em mim e por mim. Desfaço as probabilidades de me duplicar, resisto à tentação de me banalizar e permaneço – por vezes eu.



(…) Pertenço às palavras que não sei escrever, mas sinto-as. Quero-as por direito de as poder repartir. Ouço a música que chega do fundo, bem do fundo das minhas fantasias. Um dia vou rescrever uma vida inteira de pequenos nadas, há procura de um enorme tudo. Depois tocarei, com a ponta dos dedos nas melodias que se tornam opacas e em tons garridos. Depois do alto da nuvem que um dia conquistei, liberto-me e deixo-me cair.


(…) Lembro-me e relembro-me, do dia em que as ondas cresceram. Ficaram tão altas como o convencimento de alguns simples humanos. Volto atrás, lembro-me e relembro-me, do dia em que as ondas cresceram –, repito-me. Estavam altas, mas só me lembro da grandeza da natureza que nos percorre e nos deixa percorrer. Um dia sonhei ser o vento, nunca mais deixei de sorrir, no dia em que fui mar, cresci meio metro na minha humildade, outro fui chuva, no outro fogo – e hoje sou eu.



Apeteceu-me

"O óbvio nem sempre é o mais sensato". Charles de la Folie