terça-feira, setembro 25, 2007

Real vida

(…) Sentia o cheiro, de um lado pinheiros, do outro pequenos molhos de flores silvestres amarelas. Um odor intenso a campo. Seguia num passo certo, não muito rápido mas decidido. Pequenos pássaros saltavam entre arbustos. Do meio da mata vários sons, por entre as folhas secas que se encontram no chão. O corpo sua, vai-se derretendo lentamente. A sua alma eleva-se na busca da sua calma. Sente-se, antes de se corromper. A respiração torna-se mais forte. O peito roça na pequena camisola de alças que lhe cobre o busto.

(…) Entre a terra e a erva, onde os pés se vão cravando conforme segue em frente. Quero percorrer outros caminhos. Ruborizo com os pensamentos que me ocorrem. Aquela aragem, o meu cheiro, a minha vontade e o desejo de ser única naquela paisagem – violam-me a serenidade da ocasião. Baixo-me para apertar o atacador, sinto o suor que desce do abdómen em direcção a mim. Percorre-me como uma leve pena. A respiração torna-se mais profunda.O aroma dos pinheiros penetra-me e entra nos meus pulmões.



(…) Fecho os olhos à procura dos silêncios daquela manhã. Ouço mais uma vez o despertar do meu corpo, o desabrochar dos meus poros que emanam cheiros de volúpia. Preciso de ser apreciada por quem me merece. Parada naquela pequena clareira de avanços e recuos, segue-me o ruído das agulhas caídas dos pinheiros. Respiro fundo. Mãos na zona lombar, olho para cima, estico o tronco. Os peitos sensíveis e duros, o roçar fere. Toco-lhes, percorre-me um irremediável tremor pela espinha.

(…) Poisa uma rola num tronco defronte a mim – observa-me. Sinto-me desejada, fecho os olhos. Sou eu que me desejo. Só que não sei como. Os calções justos, que descem por mim até ao joelho afagam-me e afogam-me os movimentos. Percorro mais uma vez a cúpula das árvores, revejo o céu azul. Ajeito-me dentro de mim, alongo-me em direcção a nada, o corpo cede, range e estala. Invade-me a angústia de me redescobrir na minha imensa solidão.



(…) Concentro-me em mim, no meu eterno e terno desejo. Começo a querer saborear o sal que sai de mim. Perna atrás de perna, sistematicamente em passo de corrida, faz sair ainda mais de mim para fora. Todo o centro de mim roça, em toda a minha sensualidade. Como o galope de um cavalo. O vento faz esvoaçar os meus cabelos que se vão prendendo, quando em vez na boca. Humedeço os lábios secos do cansaço, percorre-me novamente o silêncio do campo. Deixo-me ir em direcção à minha vida real.





Apeteceu-me




" Entre o desejo e o sentimento percorre-nos a realidade muitas vezes cruel". Charles de la Folie

terça-feira, setembro 11, 2007

Imagem brutal

(…) Sentia-me tranquila a pensar em mim. Sentada na borda da minha cama puxava calmamente as minhas meias novas de rede – pretas. Sorria, gostava de o fazer, enquanto tirava partido de mim. Adorava seduzir-me, olhava para o espelho enquanto as puxava. Tinha umas pernas bonitas, brilhantes e bronzeadas. Uns joelhos sem marcas, umas coxas compridas que terminavam nuns quadris carnudos e apetecíveis. Gostava de passar a mãos devagar por elas, senti-las. Nada como fazer jogos de sedução comigo, fazer umas meias percorrer por cima daquela pele sensível e cheia de vontades.










(…) Tinha ao espelho a mesma sensação de quando sou olhada e apetecida - naquele momento fiquei envergonhada. Fixei-me nos meus próprios olhos, embaracei-me comigo. Tinha medo de mim, pensava que me podia negar aos meus belos prazeres. Estava a ser egoísta, preferia-me a ser preferida. A cumplicidade entre o meu espelho, a minha imagem e os meus prazeres assustavam-me, mas não me desanimavam.




(…) Enquanto me olhava, massajava a sola dos meus delicados pés. Eram sensíveis ao toque, havia partes que me faziam humedecer os lábios, me punha desconcertadamente atenta a sinais que me chegavam. Imaginava alguém a percorre-los com a língua, e sentia uma vontade incontornável de me ter. Com a ponta dos dedos sentia os tornozelos, contornava-os até ao peito pé, e massajava toda a parte inferior. Estava em mim o poder de me deslumbrar. Olhava para o espelho e … ali estava parada a espera de um movimento perdido em minha direcção.



(…) Cresci a olhar para mim, mas nem sempre me vi como hoje me vejo – com prazer. Houve tempos em que me odiei… odiei cada passo que dei até me conquistar. Sinto nas pernas o meu peso, como sinto nelas o meu poder de encanto e de poder subornar-me nas alturas em que me odeio. Gosto de passar as mãos de uma forma suave. Percorrer as coxas de uma forma calma e cativante, percorre-las e enganar sítios que me querem e humedecem com a violência de um olhar.



(…) Deixo-me cair para trás na cama. Com as mãos na zona abdominal faço força para conseguir levantar as pernas para cima. Observo-as, contemplo-as, deixo-me levar pela sua beleza. Vejo e revejo-me, dona dos meus próprios destinos, vontades e prazeres. Penso quem sou e quem fui, e desejo desejar-me sem que isso me provoque fúria, ansiedade, desespero, irritação. Dependo de mim para manipular os meus sentimentos e vontades. Olho para a imagem que se deixa reflectir no espelho, e cada vez mais sinto que sou dona de mim do meu corpo. Só eu me poderei magoar.


Apeteceu-me


"Revi ontem a tua imagem, mas só hoje me apercebi como sou". Charles de la Folie