segunda-feira, dezembro 17, 2007

Mente…




(…) Esvaziava a cabeça em alturas de grande pressão. Percorria o abismo numa velocidade extemporânea. O tempo pára, a imagem deixa de ter sentido, o movimento torna-se lento, dentro de uma representação parada. Os olhos raiados de sangue, não perdem a lucidez de quem sabe por onde ir. Espaços que se abrem como um puzzle de peças reais que se transformam em ideias gelatinosas. Há arrogância no corpo desnudado de sentido. É preciso esperança para o equilíbrio. As mãos abrem-se, formam um travão de atrito num processo relativamente moroso. O corpo perde-se num vazio, ora cheio de cor, ora numa escuridão tremenda.

(…) Não há promessas, está fechado. Há um negro e violento desejo de nada. Uma nuvem negra enrola-se numa espiral em volta do corpo à procura de uma identidade. Perdido, sem vontade de regressar enquanto a resposta estiver escondida. Um buraco, mais um, sempre mais um –, abrem-se ao ritmo de uma rajada de balas enfurecidas. Bate como o coração, a caixa craniana começa a ser escassa para tanto batimento, movimentos contínuos até rachar. Olhos fechados, sente-se o agitar das orbitas por dentro, numa dança desenfreada.


(…) A obscuridade junta-se num canto do espaço bem longe. À sua volta nada, a não ser espaço vazio de coisa alguma. Há a mentira demente da mente. As palavras soltam-se, constroem frases sem sentido que apontam direcções. Nos braços as veias saltam para fora da carne, empurram a pele numa convulsão de velocidades em tons vermelho escuro. Continua dormente a mente. O corpo recusa-se a acordar, não há acordar possível – a verdade não se liberta. Rodopia mais uma imagem à sua volta… numa imagem parada e complexa.

(…) Lento é o acordar, vacila ainda nos pensamentos. Procura palavras que demoram a sair. Esconde o desconforto das horas numa letargia e apatia exageradamente necessária. Os dias passaram sem se dar pelas imagens que crepitaram alucinantes do estertor da morte. Acorda, desperta, olha à sua volta, o mesmo de sempre. Procura sinais da sua existência, procura dentro si o seu destino. Encontra o amargo de sempre - ter de viver a sua vida.

“ Vale sempre a pena descobrir que o nosso reflexo pesa tanto como nós”. Charles de la Folie

terça-feira, novembro 27, 2007

Cruzamentos Pacificos

(…) Percorria a cidade de uma forma pacífica. Gostava de olhar ao meu redor e ver o que me acompanhava. A imensidão daqueles prédios que se perdiam no céu. Um enorme manto branco estendia-se pela 5.ª avenida abaixo. Lembrava-me dos tempos em que na minha terra acendia a lareira, mesmo sem companhia abria uma garrafa de vinho e deglutia-a por prazer. Faltava o cheiro… o cheiro da lenha a arder, do meu corpo em ebulição. Caminhava perdida à procura de achar o que ali me levara.


(…) Num outro silêncio, num outro mundo, numa outra realidade, ali estava eu. Despida de mim. Mergulhava o mais fundo que podia para redescobrir quem eu era. Tocava-me, sentia-me, acariciava-me, o corpo revelava-se. A minha alma enlevava-se em novos horizontes. Tinham-me abandonado, mas cresci. Houve dias em que me odiei, foram muitos infelizmente. Num beijo diferente, num sinal perdido, numa mensagem estranhamente enganadora, redesenhei-me. Sinto o toque dos meus dedos, que me fazem companhia.


(…) Continuava a passear tranquilamente na companhia dos edifícios. Pareciam dobra-se em forma de cumprimento à minha passagem. A força do vento fazia-os murmurar-me palavras sentidas. Erguiam-se portas… enormes portas que me levavam a sítios luxuosos. Entrava, sonhava com o meu corpo despido. Lentamente colocava cada peça, das mais belas já vistas no meu corpo. Abria os olhos e lá estava eu, do alto de mim própria vestida de mim.


(…) Antes de me tocar paira um sentimento de desconforto na minha consciência. Desvanece-se ao primeiro percorrer. Trinco os lábios, saboreio o sangue, humedeço o indicador. Indico-lhe um rumo em direcção a Sul. Percorro lentamente, descubro como a minha pele é macia. Rodopio-o em mim. Há uma força incontrolável no meu estômago. Ouço o meu arfar, desejo-me. Deixo-me cair naquele chão macio, e por ali fico em posição fetal.



(…) Dois arrepios de frio, quando olho para aquele colar de diamantes. O seu brilho cega-me. Imagino-o no meu pescoço, só eu e ele, despida. Percorro-me no espelho da minha imaginação e toco-me com o olhar. Suspiro desenfreadamente. O bafo quente que sai da minha boca forma uma nuvem no frio que caminha por ali. O vidro embacia, mas nem por isso deixo de estar nua, só já não vejo o colar. E sinto percorrer dentro de mim a sensação de prazer.

(…) Deitada num outro mundo, numa outra realidade, sorrio. As minhas mãos tapam os seios que se erguem de desejo. Respiro fundo. Respiro-me. Regressa a mim o odor que se liberta das minhas vontades. Humedeço os lábios enquanto me vou percorrendo. Caminho em mim num percurso de desejo. Libertam-se pequenos sons, gritos surdos da minha imaginação. Quero-me. Quero-me cada vez mais nesta minha nova descoberta.

Apeteceu-me


"Nunca sabemos realmente o que desperta em nós as vontades". Charles de la Folie



Este foi o ultimo dos textos da série - A minha Alma de Mulher -

terça-feira, novembro 13, 2007

O Jogo

(…) Gostava daquele ritual, de se vestir confortavelmente com as cores de sempre. Domingo soalheiro, céu azul sem nuvens, temperatura amena, sem ponta de vento. Gostava de sentir o som crescente dos adeptos, o fervilhar a volta do estádio. Olhava à sua volta, via-se e revia-se. Passo largo para não perder 1 segundo fosse do que fosse. No pescoço o cachecol de sempre, oferecido há muitos anos pelo seu Pai. Grande parte das vezes fazia-o por ele.


(…) Adorava o cheiro da relva molhada. Aquela entrada, entre o nada e o tudo… entre o cinzento do betão e o explodir do palco, verde de contornos brancos. Tocava-me na alma e no corpo aquelas sensações. As vozes aclaravam-se. Nunca tivera grande timbre para cantar, mas a minha voz, aguda por vezes esganiçada, parecia sair de mim mais alta que todas. Os cânticos percorriam-me a pele, arrepiavam-me como as mãos de alguém que já não se lembra de mim.



(…) Os minutos de espera são horas, a bola não rola, não rodopia, não se movimenta. Dentro de mim crescem-me vontades. O aroma a impacienta é descontrolado, os movimentos de cor, são desfasados. Sinto-me cada vez mais mulher dentro daquele palco de homens. Olho à minha volta, poucas são as que mordiscam os lábios. Que sentem o calor intenso dentro delas. Estão ali obrigadas e sem vontade. Pensam noutras coisas.


(…) Soa um apito, meia dúzia de segundos depois o meu corpo liberta-se. Grito, salto, protesto, rio e choro. Os cânticos ecoam, fazem eco dentro de mim,. Percorrem-me como dedos sensíveis que me conhecem e repartem. Fico desajeitada, amparo com a palma das mãos, de peitos esticados a minha zona lombar. Relaxo, fico com vontade… sento-me e perco posição. Jogada perigosa –, levanto-me de um salto, e levo as mãos à face.

(…) Reprimo, mais uma vez o árbitro. A posição falta-me, sinto por perto os vários bafos masculinos. Quais predadores no seu habitat natural. Cordiais, nem sempre. Grande parte das vezes os seus olhares desferem estucadas de morte das quais me desvio subtilmente. O meu sorriso é pelo prazer que tenho neste jogo. Sou seduzida por ele. Gosto das reacções que são produzidas em mim durante os 90 e tal minutos.

(…) É emocionante, tentar perceber como a jogada se constrói. Imprevisível a forma como vai correr. Do outro lado o desespero, são tentativas e mais tentativas. Deixo de pensar, fico vazia. Solto-me e deixo só os meus olhos funcionarem. A bola está cada vez mais perto do objectivo. O meu corpo torna-se numa enorme mola, comprimida a espera que a soltem. O pontapé é mortal. Solto um grito lancinante. Naquele momento todos os meus medos, problemas, até a minha vida desaparecem. Abraço-me, pulo, dou palmadas nas costas deste e daquele. Sinto-me latejar de prazer. Mais uma vez apetece-me gritar voluptuosamente.



Apeteceu-me

"Há a vontade de percorrer o teu sorriso, nem que seja só com o olhar". Charles de la Folie

segunda-feira, outubro 22, 2007

Utopia


(…) Gosto de me projectar para uma mundo diferente. Não foram poucas vezes que me vi diante um público entusiasta a olhar os meus saltos em tudo magníficos. A minha elevação o meu poder de me fixar e permanecer no ar. Ou um pequeno chassé, que espelha nos meus pés a vontade de voar em pontas de fogo. O meu corpo quente de vontades, permanece em movimento para arrefecer o desejo que me percorre. Gozo o meu corpo vivendo tudo o que não posso nem consigo. Sonho com o corpo que não tenho, vejo-o de forma diferente. Deste que é meu, saem projecções de mim, que se reflectem no meu gemer.



(…) Não sei de quem é o barco que me leva. Gosto do vento que me afaga o corpo e me arrepia. Sentir o rasgar do mar, como quem rasga um corpo com as unhas. Olha-lo no fundo, no horizonte. Perder de vista o tempo, com que medimos os sulcos da nossa pele. As curvas com sabor a sal. A temperatura com odor ao meu prazer que desce de, e em mim. Sentir-me acompanhada, com a personagem que se reflecte na água verde sem esperança. Revolta-me o corpo os pensamentos mais altruístas, as minhas mão só podem ser outras mãos num empenho que é meu.

(…) Perco-me pelos meus caminhos. Enormes encruzilhadas que recaem nos meus pensamentos. Direita, esquerda, cima, abaixo, fico-me. Parada recolho o céu que cai sobre mim. Arrepio-me mais uma vez com medo das minhas ilusões. Dos monstros e fantasmas que não me largam. Já estão tão longe, mas sempre tão presentes que tenho medo que sejam reais. Não pode! Nem quero, quero trilhar outras veredas, outras vaidades, outros sentidos que não direcções. Sigo-me, os dedos palmilham-me. Abre-se-me aquele sorriso meio parvo quem não se controla… assusto-me.


(…) Nem sempre reconheço os espaços que me rodeiam. Aquela fragrância de carmim que se esconde envergonhada de tempos em que foi abusada. Choro compulsivamente dentro de mim, da mesma forma que recupero suspiros dos tempos em que o espelho despertava fúrias. Experimento outra vez aqueles pequenos corrupios –, entre o absolutamente e o delicadamente carnal. A pele eriça-se, protejo-me de olhares mais perversos – os meus próprios olhares. A minha orbita volta a céus onde a musica suporta todo o desejo daquele caminho percorrido tantas vezes…


(…) Levanto-me, ergo-me mais uma vez perante o meu corpo. Está nu. Nada me separa de nada. Sinto vozes, que vociferam palavras de deleite. São armas que entram por mim e me descontrolam. As minhas mãos interpretam sinfonias, verdadeiros solos de poesia. Contorço-me, fecho-me, antes de me abrir e sentir o descolar da minha alma. Arremesso-me de encontro aos meus segredos. Tremo sem medo. A espinha contorce-se de uma vontade ir sem nunca chegar. Há um percurso que se vê ao longe e tenta-se perpetuar no momento. Ingrata a missão entre o querer e o ter, sabendo-se que se vai chegar. – Mesmo que sozinho.


Apeteceu-me

" Uma Mulher é sempre Mulher mesmo na desgraça, um Homem é sempre uma desgraça perante o seu olhar". Charles de la Folie

terça-feira, outubro 09, 2007

Espaços

(…) Aquele acordar de manhã, arrepiava-me. Tinha saudades de quando me tocavas. Não percebi a tua partida. Deixaste-me para sempre aqui envolta nos meus lençóis –, num despertar agoniante. Tento aguentar-me mais um dia, mais um dia que aparece e desaparece em mim. O meu corpo começa a degradar-se, sem a tua sábia oração a ele. Toco-me, não é a mesma coisa. Sinto-me em mim, gosto sobre maneira. Mas falta-me o teu arfar, aquela lufada que me percorria num sonho de carícias.




(…) Já não me lembro, do dia em que foi. Olhei-me ao espelho depois de me levantar. – Não me reconheci. Estava velha. Pior, senti-me velha, envelhecida na minha própria imagem. Despi-me como quem se despede. Puxei a cortina da banheira –, até me deixar espaço para entrar. Levantei uma perna, apoiando-me em algo que não me lembro- levantei a outra com a agilidade que há muito já não tenho. Sorri, gosto de sorrir. Senti a agua que percorria o chuveiro a embater em mim até acordar.





(…) Gosto do toque do turco. Macio eleve. Leva-me por ai, socorre-me. Tapa-me espaços e brechas que se abrem por ai, no meu corpo. É acutilante. Gosto de me abraçar a ele… ou a ela. Já não sei se por vergonha ou pudor, que não o faço a janela a olhar para longe. Tão longe quanto possível. Apaga a água que há em mim, escorre-a, absorve-a. Um ciúme que me revolta por vezes. Entre a água que gosto de sentir, e aquele que me faz tremer. Gosto de sentir o turco a roçar os limites de mim. É boa aquela sensação.


(…) Andava nos limites de mim mesma. Tinha medo do que ia na minha alma. Nada de especial, coisas de gente menos nova. As varizes já tinham de ser acalmadas, com pequenas massagens. Gostava de as acalmar, acalmava-me depois outras coisas que por vezes estavam esquecidas. Sentia a vontade de as percorrer –, enquanto fechava os olhos. Tinham-me ensinado a nunca desistir. Eu sabia que não podia desistir de mim. Já não havia ninguém a quem recorrer.




(…) Já nada me faz esquecer o passado. Lembro-me que nem tudo foi preenchido. Mesmo assim… duvido que alguém possa ter o que tive. Os cheiros, as imagens, os sons –, estão todos dentro de mim. Muitas vezes, quando me arrepio ao acordar, enrolo-me nos lençóis e deixo-os percorrer… por mim. Sinto-o como senti tantas coisas em mim. Quando saio daqueles banhos, em que a agua me consome o fogo –, a toalha de turco recorda-me as mãos que me pertenceram. Fico feliz, por nunca ter tido uma coisa – a solidão.



Apeteceu-me




"As duvidas que se abatem sobre nós, também nos erguem." Charles de la Folie

terça-feira, setembro 25, 2007

Real vida

(…) Sentia o cheiro, de um lado pinheiros, do outro pequenos molhos de flores silvestres amarelas. Um odor intenso a campo. Seguia num passo certo, não muito rápido mas decidido. Pequenos pássaros saltavam entre arbustos. Do meio da mata vários sons, por entre as folhas secas que se encontram no chão. O corpo sua, vai-se derretendo lentamente. A sua alma eleva-se na busca da sua calma. Sente-se, antes de se corromper. A respiração torna-se mais forte. O peito roça na pequena camisola de alças que lhe cobre o busto.

(…) Entre a terra e a erva, onde os pés se vão cravando conforme segue em frente. Quero percorrer outros caminhos. Ruborizo com os pensamentos que me ocorrem. Aquela aragem, o meu cheiro, a minha vontade e o desejo de ser única naquela paisagem – violam-me a serenidade da ocasião. Baixo-me para apertar o atacador, sinto o suor que desce do abdómen em direcção a mim. Percorre-me como uma leve pena. A respiração torna-se mais profunda.O aroma dos pinheiros penetra-me e entra nos meus pulmões.



(…) Fecho os olhos à procura dos silêncios daquela manhã. Ouço mais uma vez o despertar do meu corpo, o desabrochar dos meus poros que emanam cheiros de volúpia. Preciso de ser apreciada por quem me merece. Parada naquela pequena clareira de avanços e recuos, segue-me o ruído das agulhas caídas dos pinheiros. Respiro fundo. Mãos na zona lombar, olho para cima, estico o tronco. Os peitos sensíveis e duros, o roçar fere. Toco-lhes, percorre-me um irremediável tremor pela espinha.

(…) Poisa uma rola num tronco defronte a mim – observa-me. Sinto-me desejada, fecho os olhos. Sou eu que me desejo. Só que não sei como. Os calções justos, que descem por mim até ao joelho afagam-me e afogam-me os movimentos. Percorro mais uma vez a cúpula das árvores, revejo o céu azul. Ajeito-me dentro de mim, alongo-me em direcção a nada, o corpo cede, range e estala. Invade-me a angústia de me redescobrir na minha imensa solidão.



(…) Concentro-me em mim, no meu eterno e terno desejo. Começo a querer saborear o sal que sai de mim. Perna atrás de perna, sistematicamente em passo de corrida, faz sair ainda mais de mim para fora. Todo o centro de mim roça, em toda a minha sensualidade. Como o galope de um cavalo. O vento faz esvoaçar os meus cabelos que se vão prendendo, quando em vez na boca. Humedeço os lábios secos do cansaço, percorre-me novamente o silêncio do campo. Deixo-me ir em direcção à minha vida real.





Apeteceu-me




" Entre o desejo e o sentimento percorre-nos a realidade muitas vezes cruel". Charles de la Folie

terça-feira, setembro 11, 2007

Imagem brutal

(…) Sentia-me tranquila a pensar em mim. Sentada na borda da minha cama puxava calmamente as minhas meias novas de rede – pretas. Sorria, gostava de o fazer, enquanto tirava partido de mim. Adorava seduzir-me, olhava para o espelho enquanto as puxava. Tinha umas pernas bonitas, brilhantes e bronzeadas. Uns joelhos sem marcas, umas coxas compridas que terminavam nuns quadris carnudos e apetecíveis. Gostava de passar a mãos devagar por elas, senti-las. Nada como fazer jogos de sedução comigo, fazer umas meias percorrer por cima daquela pele sensível e cheia de vontades.










(…) Tinha ao espelho a mesma sensação de quando sou olhada e apetecida - naquele momento fiquei envergonhada. Fixei-me nos meus próprios olhos, embaracei-me comigo. Tinha medo de mim, pensava que me podia negar aos meus belos prazeres. Estava a ser egoísta, preferia-me a ser preferida. A cumplicidade entre o meu espelho, a minha imagem e os meus prazeres assustavam-me, mas não me desanimavam.




(…) Enquanto me olhava, massajava a sola dos meus delicados pés. Eram sensíveis ao toque, havia partes que me faziam humedecer os lábios, me punha desconcertadamente atenta a sinais que me chegavam. Imaginava alguém a percorre-los com a língua, e sentia uma vontade incontornável de me ter. Com a ponta dos dedos sentia os tornozelos, contornava-os até ao peito pé, e massajava toda a parte inferior. Estava em mim o poder de me deslumbrar. Olhava para o espelho e … ali estava parada a espera de um movimento perdido em minha direcção.



(…) Cresci a olhar para mim, mas nem sempre me vi como hoje me vejo – com prazer. Houve tempos em que me odiei… odiei cada passo que dei até me conquistar. Sinto nas pernas o meu peso, como sinto nelas o meu poder de encanto e de poder subornar-me nas alturas em que me odeio. Gosto de passar as mãos de uma forma suave. Percorrer as coxas de uma forma calma e cativante, percorre-las e enganar sítios que me querem e humedecem com a violência de um olhar.



(…) Deixo-me cair para trás na cama. Com as mãos na zona abdominal faço força para conseguir levantar as pernas para cima. Observo-as, contemplo-as, deixo-me levar pela sua beleza. Vejo e revejo-me, dona dos meus próprios destinos, vontades e prazeres. Penso quem sou e quem fui, e desejo desejar-me sem que isso me provoque fúria, ansiedade, desespero, irritação. Dependo de mim para manipular os meus sentimentos e vontades. Olho para a imagem que se deixa reflectir no espelho, e cada vez mais sinto que sou dona de mim do meu corpo. Só eu me poderei magoar.


Apeteceu-me


"Revi ontem a tua imagem, mas só hoje me apercebi como sou". Charles de la Folie

segunda-feira, agosto 27, 2007

ARDENTE (MENTE)



(…) Dentro de mim crescia dia após dia a vontade de partir. Os meus sonhos pareciam ter terminado. Os meus desejos, já não eram. Vivia um pesadelo que aparentemente crescia em mim. Dava por mim prostrada, cabisbaixa, ombros encolhidos, costas quase enxovalhadas como um trapo. Longe iam os dias em que olhava para mim ao espelho e me interrogava… até onde poderia chegar aquele corpo (quase), perfeito.



(…) Havia dias em que o meu pensamento percorria histórias passadas. As minhas seduções (longe vão os tempos) … A verdade é que gosto de me seduzir a mim. Já não tenho muito tempo para me seduzir, arrebatar-me, deslumbrar-me… comigo mesma. Tenho-me, mesmo que enrugada e enlutada por algo que já não funciona. A minha cabeça funciona, os meus sentidos também.





(…) É curioso, como o suor ainda escorre, quando relembro momentos quentes. Muitas vezes passo as mãos por mim, sinto o corpo descaído e abatido… mesmo assim a minha mente (mente-me). Ai, como sinto um leve sopro de mim a repassar a pele a torneá-la. Fico com medo que a morte me leve no meu último fôlego de me reconciliar com o prazer libidinoso.




(…) Não sei onde vou, nem porque vou… muito menos sei se quero ir. Umas vezes penso que já cá não faço nada. Há outras, ai, se há… há outras que começo dentro de mim a desfolhar as minhas memórias e encontro a força imensa para perceber que sou imortal. Gostava agora de ser imoral. Tivesse eu o corpo de outros tempos e despia-me, ia para a rua mostra-lo, fazer inveja a quem tem pudor pela vida e por si.





(…) A verdade dói, custa-me já a levantar todas as manhãs. O meu corpo esta a desfazer-se por dentro. Morre aos poucos como o tempo. O que fui e o que sou! Sinto cada vez mais as paredes a estreitarem-se sobre mim… já não tenho a força de braços que tinha, para as afastar e não me sufocarem. Cerram-se e serram-me o juízo. Tenho vontade e necessidade de permanecer junto aos pequenos perfumes que tento percorrer na minha memória.


(…) Onde estão? Por onde andam as duvidas que me vão percorrendo. Dobro a espinha, na esperança de encontrar entre as minhas pernas o vazio que me pode preencher os dias que me faltam. Faltam me dias!? Espero que não me façam falta, quero ter tudo pronto para quando um dia tiver que ser, fique com a minha conta dos dias saldados. Só um momento, e assusto-me. Arrepio-me de pensar que ela… ai está, pronta para me levar. Não me quero sentir só.




Apeteceu-me

“ Pior que a Morte é sentirmos a espera dela”. Charles de la Folie

terça-feira, julho 31, 2007

Sentido em MIM

(…) Tinha uns olhos brilhantes! Aqueles olhos cintilavam no seu prazer de viver. Cinzentos, cor de nada, ao sol ficavam verdes cor de tudo. Olha-la nos olhos, era como enfrentar um furacão de emoções, descobrir um poço sem fundo de sentimentos. Ternos, um poema eterno para ser cantado ao longo de mil anos. Quando os fechava, tudo à sua volta morria. Mas dentro de si, tudo despertava, sentia no escuro do seu regresso, chegar perto de si o prazer do seu corpo. Os olhos, a sua visão tornava-se numa espiral de monumentais emoções. No seu olhar percorriam-lhe os tremores do desejo do seu desejo. Via-se e revia-se.





(…) Gostava de cheiros. Da sugestão que os cheiros lhe davam. Entravam dentro de si, na sua mente, mais depressa que o ar lhe chega aos pulmões. Vivia mais depressa, a um ritmo sensível que lhe chegava pelo olfacto. Percorria o seu corpo pelo cheiro, sabia, e sabia-se. Aquele cheiro que vinha dentro de si, só de o imaginar molhava-a. Redescobria-se, enquanto respirava fundo, e cada vez mais sentia-o entrar. Odores, quentes, ácidos e doces, que evoluíam dentro de si prontos a sair. As suas narinas fortes, abriam com força, com a mesma vontade que o cheiro do seu prazer… saia de si.






(…) Os sons, que cresciam àsua volta, despertavam-na, a ela e não só. Aquelas músicas, as melodias, que a faziam crescer, percorriam-lhe a alma de cima, a baixo. Os sons do seu corpo a despertarem memórias da sua vontade. O silêncio do seu encanto, a desmentirem que o seu corpo se mantinha desfalecido. Gostava de ouvir o som das cordas do violino a serem rasgadas pela crina do arco, numa supinação infernal. O corpo reagia a esses sons da mesma forma que a um murmúrio, bem junto do ouvido. Onde as pequenas aragens que vão saindo quando são proferidos os sons, as palavras, as frases, põem em duvida a confiança que existe dentro do meu ser. Gosto de ouvir o tilintar da sua tentação.





(…) Quero o sabor dos meus lábios. Quero o sabor a sangue quando os trinco e os lambo. Sentir a minha língua a humedece-los enquanto outros lados se vão transformando em pequenas cascatas de mim. Os sabores do amor, do deleite, do gozo percorrem-me por dentro, transformando-me por fora. Sentir o fresco na minha língua, junto com o calor que vem de fora. Percorre-me por dentro a vontade de sentir o sabor de tudo, de ser ainda mais mulher por me ter e querer. Quero sentir uma vez mais os lábios molhados, humedecidos pelo gozo que me dá vir-me em mim. Por isso… quero o paladar do meu gemer.






(…) Percorro-me, com o suave toque dos meus dedos. Leio-me, concretizo-me, dou-me a conhecer. Percebo que o meu corpo é uma cartilha do meu próprio entusiasmo. Conhecer o meu gozo, e gozar-me. Satisfaço-me, com dois dedos que caminham como duas pequenas pernas… conhecem, montes e vales…deleitam-se em poços onde a esperança nasceu. Apalpam as melodias que sugerem a beleza que se encontram numas pernas há muito poupadas de outros sofrimentos. Sinto outros amores, gosto de entrelaçar os dedos em pequenas florestas que me fazem sonhar. Sentir na ponta dos meus dedos o meu fundo que me faz saltar e soltar os gritos da minha libertação.








Apeteceu-me





" Nem sempre percorrer é chegar, por vezes é o caminho mais longo para nos conhecer". Charles de la Folie

terça-feira, julho 10, 2007

AMANTE

(…) Olhava-o nos olhos, fixava-os. – Eram doces como o mel, calmos como o prado, tranquilos como a tua imagem quando se reflecte em ti. Passava-lhe com a mão no pescoço, sentia a sua respiração, forte e quente perto do meu rosto. Sentia-me assustada sempre que estava diante dele, mas sentia-me mais que nunca, sentia o prazer do momento, de cada pedaço daquele instante. Estremecia só de o pensar.

(…) Gostava daquele ritual, não me sentia uma amante apesar de ser de outro. Eram diferentes, um a liberdade, outro a escolha que foi feita em tempos de paixão. Fitei-o novamente nos olhos, num movimento seguido senti o seu aproximar – a sua boca roça-me a cara. Ternamente toquei-lhe, juntei-o, e deixei-o estar junto a mim durante alguns segundos. Passei-lhe com a mão ao longo dele.

(…) Houve tempos em que tive medo, muito medo, estava presa em mim. Os gestos de liberdade fugiam-me, não que os não soubesse utilizar. Estava petrificada no meu mundo, na minha maneira de ser. Tive medo de ter perdido a mulher que existia dentro da minha alma, em que corria, lado a lado com os meus pensamentos mais incómodos e libertinos. – Não para mim, mas para eles que não se libertam do bom que a vida nos proporciona.

(…) Ali estava eu com ele, liberta de mim e em mim. Sabia-o desde sempre que ali, conseguia sentir o que mais ninguém conseguia fazer-me alcançar. Retirou o lenço dos seus longos cabelos ruivos, arregaçou as mangas da sua camisa de bombazina rosa, olhou-o mais uma vez nos olhos, sentiu-o ainda mais calmo. Abriu a porta, uma longa porta de madeira tratada, presa por duas enormes dobradiças de ferro. Um fecho de ferro forjado, bem oleado para não emperrar em situações mais complicadas.

(…) Era um bonito alazão, de um tom de ouro avermelhado. Uma enorme crina cor de palha dourada. A sua cauda também, palha dourada, muito bem penteada e arranjada. Olhando para ele, não se dava conta que descendia de uma linha evolutiva de sessenta milhões de anos. Lentamente punha-lhe o arreio, calmamente colocava-lhe um freio que não o ferisse na boca, tal era a confiança e a empatia que existia entre nós.



(…) Enquanto lhe fazia festas no dorso, colocava-lhe uma manta, para depois lhe colocar a minha pequena sela de couro, um couro muito suave com um toque muito especial. Ali estava eu, sentindo a sua disposição para lhe apertar a sela junto à barriga, e ajustava os estribos. Estava pronta para a minha viagem. Entre nós não havia mais nada, nem esporas, nem chicotes, éramos só os dois em direcção a liberdade.

(…) Tomava-lhe as rédeas e partíamos, para os campos junto ao rio, onde o gado costuma pastar, gostava de ver o rio descer. Dava-lhe a liberdade de me tomar. Dava-lhe rédea solta, e galopava, num galope solto e continuo… a minha sela sentia-me tocar-lhe passo sim passo não, era um sobe e desce constante. O corpo começava a ceder, o cheiro do campo entrava pela alma. Os gritos de prazer tornavam-se constantes.

(…) O seu corpo começava a derreter-se. No sobe e desce do galope, os seios iam crescendo ao roçarem-se na sua camisa. O vento batia-lhe no rosto. Olhos abertos cheios que lhe percorriam a face, provocadas pela emoção de se sentir livre e em perfeita harmonia com o seu corpo. Tinha-se e vinha-se num percurso que só aquele alazão de olhos doces como o mel ,lhe sabia provocar.

Apeteceu-me

"Gosto de percorrer caminhos diferentes, com o objectivo de voltar a percorrer outro diferente em dias iguais". Charles de la Folie

terça-feira, junho 26, 2007

1 Segundo (de mudança)

(…) Ali estava eu de braços abertos a espera que a vida se encaixasse em mim.
Sentia o tempo a passar, roçava-se pelo meu corpo, contornando as formas que ele me ia dando, cravava marcas cada vez mais fundas. Movimentava-se a minha volta sem conversar, sem dizer, sem explicações, sem nada. Era impotente para o parar, mas recordava-o dia a dia.

(…) Parava no momento, ali cravada no fundo azul e via, o que foi, o que era e o que tinha. Por muito que ele me deixasse no limite sentia cada vez mais afecto por mim, estava viva e em harmonia com os meus sabores, assustava-me com o definhar que por ai vinha. Um dia, esse dia viria, estava na altura de pensar nele, sabia porém como a minha mente era forte, por isso antes dele chegar teria de me percorrer com cuidado.





(…) Olhava para mim como nunca o tinha feito, tinha a sensação de ter herdado um corpo novo, com novas sensações, com novos limites, tinha na ideia os interesses simples que o meu corpo me ia segredando. Imaginava-o e só isso me deixava louca. O meu deleite, a minha volúpia, estavam descontrolados, sem regras, sem horários, sem personagens. Estavam simplesmente ao abandono da minha fértil imaginação que se ia erguendo cada vez mais forte.

(…) Naquele momento em que estava parada de braços abertos a espera que a vida se encaixasse em mim, revelava-me, defrontava-me, percebia-me sem entender o porquê de o ser, de o querer, de o desejar cada vez mais. Não havia duvidas a minha vida estava a mudar. Tudo que tinha conquistado, fazia parte de um passado longínquo, oblíquo, sem saudades, sem historias que me envergonhassem, sem me conhecer. No meu passado não havia rostos, nem sensações, só uma mão cheia de ilusões, que foram sempre ficando para trás, violando-me e violentando-me todos os princípios.

(…) Num segundo, redescobri-me, senti a aragem a percorrer-me pela face, senti o fresco da relva que pisava a entrar-me pelo corpo. A minha túnica dançava com espírito do vento, roçava-me os seios com a afabilidade do linho, com a candura de uma pele que se esfregava em algodão. Crescia em mim a vontade de me ter, de me consumir no tempo, que ia passando por mim e dava-me a oportunidade de me reaver.

Apeteceu-me


"Temo que o TEMPO não se aperceba da nossa existencia"! Charles de la Folie

domingo, junho 17, 2007

Duche

(…) Chegava cansada, vinha de longe, por vezes de muito longe. Uma mulher simples, de silhueta limpa, contornos perfeitos. É uma mulher sozinha, mas nem por isso só, nem amargurada, a solidão, a palavra e a acção, não fazem parte do seu vocabulário, é uma terminologia proibida mesmo do seu léxico.
A sua maneira de andar, a sua forma de ser, o seu contexto na vida era discreta, de uma discrição ilusória, porque por onde passava o seu perfume emanava sensações de explicação difícil, como o arrancar violento de uma pena ao sabor de um vento qualquer (claro que isto não quer dizer coisa alguma, mas demonstra o encanto qual modelo na passerelle).


(…) - Todos os dias chegava a casa e gostava de saborear, todos os meus pequenos momentos.
Prazeres como a comida, como a música, ou mesmo a simples contemplação de pequenos objectos que me recordavam viagens por mundos distantes que eu adorava. O meu maior prazer e aquele que mais gostava de retardar pelo gozo, pela satisfação que me dava, o banho, aquele duche que me fazia recriar, recriar-me e recarregar-me.
Adorava, fazer tudo antes de me poder abandonar naquele que era provavelmente a minha maior prova de culpa de não me sentir só.


(…) Adorava despir-me para mim, gostava de o fazer a olhar para o espelho, despertar-me e olhar-me como se fosse a primeira vez que me examinava, gostava de saber se tudo ali estava. Era soberbo como o meu corpo me excitava, olha-lo provocava-me sensações que não me lembrava de alguma vez as ter tido. Realmente são muito poucas as vezes que temos tempo para nos enamorar de nós, de nos enfeitiçar. Muitas vezes chegamos à cruel conclusão que o tempo se foi e nos esquecemos que existimos.


(…) Acendia uma vela, daquelas de fragrâncias distantes vindos de lado algum como se isso fosse importante. Procurava criteriosamente uma música que me levasse para outros locais a procura do meu cheiro, esse sim importante. Ligava o chuveiro. Estremecia sempre que levantava a perna para entrar dentro da banheira, o corpo latejava, sentia a agua aquecer junto dos pés, sentia que a temperatura do meu corpo ia subir para parâmetros muito superiores, só suportáveis pela minha imaginação.


(…) Gosto de abraçar o chuveiro contra os meus peitos e ficar ali alguns minutos no meu regaço a sentir a agua quente a embater bem perto do meu coração, e a escorrer como sangue a esvair-se pelo meu ventre até deparar com a minha vontade de me abrir. Fecho os olhos e deixo de sentir a água, são milhares de pequenas mãos a percorrerem-me. Devagar aponto o chuveiro a outras partes do corpo, a outros pedaços de prazer. Com a outra mão palmilho-me, afago-me, sinto o corpo a reagir, a arrepiar-se. Gosto de sentir o calor da água no meu umbigo.
Gosto de o (chuveiro) descer e sentir a agua, pura e quente a entrar dentro de mim.





(…) Penduro-o, deixo-a correr livremente sobre a minha alma quente como o prazer, e seduzo-me, mimo-me com “geles” de mil cheiros, que se fundem com o cheiro a natureza feminina que se liberta cada vez que me toco, que me esfrego, que dou conta de pensamentos que raramente se perdem.
Sinto que estou perdida, nos meus momentos de prazer, o dia esvai-se o cansaço já ali não coabita o stress de um dia foge em direcção ao esgoto.


(…) Passo as mãos pelo cabelo molhado sinto-o macio percorro-o, enquanto inclino a cabeça para trás e sinto a agua a bater-me no rosto. Passo-as depois pelos seios, sinto as suas extremidades na Palma das minhas mãos, esfrego o abdómen, acaricio as ancas e deixo-as deslizar pelas nádegas. Toco-me, sinto-me e desejo-me. Ao contrário da manhã quando acordo que desejo que o dia não comece, aquela hora desejo que nunca mais acabe.





Apeteceu-me





"Os dias passam e nós esquecemo-nos de nós". Charles de la Folie

quinta-feira, maio 31, 2007

Monitor(izada)



(...) Ali estava no meu espaço, entre o escuro e as cores da minha imaginação. Gosto de residir naquele canto diante os fantasmas que não me atormentam! Cada dia que passa mais me afeiçoo-o a eles, espectros do dia em que me perdi, em comecei a pecar, sintio-me entre a literatura de cordel e os mais nobres clássicos escritos por profetas das palavras.


(...) Cresce-me o corpo, a alma e os prazeres, naquele pequeno espaço onde percorro com a ponta dos meus dedos o mundo, em poucos segundos. No pequeno monitor vejo muitas vezes o meu reflexo, é ai que me vejo, que revejo, o cabelo escuro pelos ombros, os olhos escuros rodeados por umas sobrancelhas muito escuras e fartas, umas pestanas grandes. O nariz que fala de mim, narinas abertas de quem precisa de muito oxigénio para alimentar as chamas que se vão apoderando do meu corpo.


(...) Gosto de observar a minha boca, mesmo que destorcida com as cores que costumam estar naquele ecrã, de sítios que procuro e temo nunca os poder encontrar, locais entre o empíreo e o érebo, por outras palavras entre o céu e o inferno, entre porra alguma. É uma boca pequenina de lábios carnudos, definidos e muito vermelhos. Gosto de os trincar, devagar como quem beija, gostava de os manter húmidos, como que colhe aragens de prazer, passar-lhes suavemente com a mão em direcção ao queixo e sentir...


(...) O monitor morre muitas vezes por ali, prescindo de me ver, a minha cara deixa de ser importante naquele quarto, escuro onde os fantasmas se afastavam agora com o odor que saia dos meus poros, qual cadela com cio. As palavras escritas começavam a distorcer-se, assim como torcia e esfregava as minhas nádegas na cadeira a procura de algum conforto. O barulho das letras a saltarem para o ecrã, enquanto os dedos escorregam pelo teclado dá lugar a um som lúgubre e monótono contrasta com a música colorida de satisfação de um corpo a enrijecer.



(...) Esfrego os pés, um no outro, sinto uma vontade enorme de me aprisionar, de me prender e de me perder entre a gula de me ter e o desejo de o ter. Adoro servir-me de mim, abusar sem ser magoada, ter-me sem me prender, destruir-me e reconstruir-me de prazer, em cada pensamento uma sensação nova. Gosto de pecar para me absolver com novos devaneios de loucuras pouco espirituais, mas sim desejos bastante carnais.
As sensações que os pés me dão, qual lambedela húmida em terrenos de degustação douta.



(...) O respirar tornava-se cada vez mais forte, mais ofegante. Os olhos fechavam-se, as pálpebras parecem ter pequenos tremores parecidos com estertor da morte. A verdade é que aqui nada acaba, tudo ganha vida, cores. Derrete-se a carne entre pensamentos que levam para longe, É ali que começa uma dança tribal, com um ritual entre os espíritos e o prazer, entre a intendência e o descontrolo irracional.




Apeteceu-me



"O que se pode ver com a alma, nem sempre se sente com a visão". Charles de la Folie

quinta-feira, maio 17, 2007

Acordar

(...) Sentia-me magnífica, harmoniosa comigo, sentia-me eu, sentia-me. - Hoje era um daqueles dias em que o seu reflexo no espelho não se mexia, perplexo com a sua beleza.
Sentia-me segura, gosto de descansar neste paraíso de coisa alguma, entre o nada e provavelmente o nada. Era claro... claro que era... como sempre mais um dia.



(...) Sentia que era mais um acordar quase irrepreensível, tinha aqueles pequenos gestos, sempre graciosos, que me acautelavam o corpo para mais um dia. Adorava estar ali deitada, com as mãos a pressionar a zona lombar, para empurrar a preguiça para fora do meu corpo, era como fazer uma pequena ponte entre o meu sedoso e sedento corpo e a cama, forrada com lençóis negros de seda. Gostava de passear o corpo por ali logo de manhã, de fazê-lo deslizar, senti-lo a roçar pela cama onde grande parte dos meus sonhos se manifestavam.





(...) Rompia comigo. Rompia-me. Quase nunca me abandono, e quando o faço, faço para me perder em mim e por mim... aos meus belos prazeres e tentações. Devolvo-me vezes sem conta para tentar ser cada vez mais perfeita no meu tocar. Gosto de me contorcer, de entender como a forma da dor é tão próxima, mas tão proxima do prazer. Como o Amor e os dissabores que caminham juntos, como os gritos que calam a Alma, podem ser tão diferentes e tão iguais aos Gritos que prevalecem na Dor.



(...) Sinto lágrimas (prazer), algumas vão caindo pelo meu corpo despido, que lentamente ganham velocidade e percorrem os meus seios até chegarem ao precipício rijo e eriçado onde ficam (lágrimas) ali no limbo. Até se desligarem e caírem com força... A força de uma sensibilidade que está à flor da pele. Sentindo aquelas lágrimas quase entrarem em mim.



(...) Mais uma manhã que me perco no meu acordar, entre sonhos que não se concretizam e pesadelos que não chegam... acredito ferozmente nas vontades de me ter e de me manusear. Quero e acredito em mim , quero cada vez mais ter-me para não me magoar. Gosto de sentir o sangue aquecer dentro de mim e violar-me de vontades que acabam sempre em conspirações cada vez mais húmidas.


(...) De joelhos sobre a cama, com as nádegas poisadas em cima dos calcanhares, entrelaço as mãos, puxo-as por cima da minha cabeça, sinto o meu corpo a esticar. Sinto-lhe o cheiro, o cheiro de um sonho, do prazer, das minhas vontades, daquilo que realmente sou, daquilo que realmente quero ser. Gosto de me ter, de me apreciar, de me experimentar, de me levar ao limite e descobrir como sou ilimitada





Apeteceu-me




"procura a morte e logo encontrarás uma bela e longa vida". Charles de la Folie

quinta-feira, maio 03, 2007

Liberta-me

(…) Adorava passear-me por ali, sentir os pés a enterrarem-se pela areia. Adorava aquelas manhãs meio solarengas com uma pequena brisa a arrefecer-me o corpo, que latejava com aquele cheiro a mar.
Os olhos vidram-se no horizonte, o sentido único onde o verde do oceano choca com o azul do céu. - Uma vez ouvi que a mistura dos dois alimentava a poesia, aleitava os pintores e perseguia os fracos de espírito. Era ali que dava o meu primeiro suspiro da manhã, onde erguia os braços em direcção ao céu e exorcizava a minha preguiça que se acumulava enquanto rebolava na cama em sintonia com os meus sonhos.














(…) O mar estava calmo, como calmamente caminhava em direcção a ele. Gostava de me sentar, na areia molhada e senti-lo a tocar-me ao de leve nos pés. Gostava de o ver subir por mim, lentamente, como os beijos. Levemente brutais, assustadoramente frios, que aquecem o corpo e descontrolam a alma. Gostava de pousar as mãos ao lado dos quadris… e brincava com a água, não a deixava tocar as minhas nádegas. Adorava quando ela (onda) bate nas pernas e salta pelo meu corpo, encharca-me os seios, e apodera-se de toda a zona abdominal, aquele frio transforma-se num pequeno vulcão que desperta um estranho, mas perfeito bailado num corpo já de si pantanoso.








(…) Gosto de brincar com o mar, rebolar-me nele, oferecer-me a ele como não o faço a ninguém. Gosto do sal que larga no corpo, de lambe-lo e sorve-lo nas partes onde a minha língua consegue chegar. Sinto-me perdida, no meio de tanta imensidão, molhada, provocada, sinto-me como gosto em pecado por mim e em mim. Sinto-me violada e oferecida, aos meus próprios prazeres, gosto de contornar o meu corpo com as mãos… sentir o eco da água a reflectir-se e a ajustar-se contra mim. São abraços intermináveis que afagam os meus prazeres e devaneios.


(…) As horas passam, sinto o meu corpo cada vez mais fechado sobre mim, a minha alma mais aberta, os meus poros escancarados, a minha vida parada em movimentos que atenuam a realidade. Aqui mando no meu corpo, no meu prazer, sou rebelde no meu amor-próprio. Mergulho de costas, abro bem as pernas para sentir a agua a entrar dentro de mim, estico os braços para sentir os seios a esticarem, o ventre a descomprimir. O sol cada vez mais se torna no pior dos afrodisíacos, impossível de parar, rasga o corpo em mil orgasmos…


Apeteceu-me




"Nem sempre a verdade está escondida, por vezes não existe"! Charles de la Folie

quinta-feira, abril 19, 2007

O canto



(…) Estava no canto, não num canto, mas no canto daquela enorme sala. Costas encostadas na parede, uma enorme parede, amarelada do fumo dos enormes tarolos que ardiam dias a fio naquela lareira com tantos anos, como vidas que por ali se aqueceram.

Podia ser um dia como outro qualquer, adorava sentar-me ali na escuridão de uma sala centenária, onde a musica se misturava com o crepitar do lume. Gostava daquele cheiro a carvalho queimado. Gostava de mim. Estava perdida na notícia que acabada de imaginar que um dia iria irromper por aquele espaço.
Custava-me respirar, cada lufada de ar que levava com mais força para dentro de mim, doía-me. Sentia os peitos a saírem-me do corpo, deslizam-me com força naquela camisa de flanela, uma camisa grossa, velha, tão velha como o seu cheiro, o cheiro do meu avô que eu tanto adorava.
(…) Estava presa em mim, restava-me a tormenta de estar só por ali. A dúvida insistia, nos meus mistérios, aquela noticia que me assolava os pensamentos, que não passava disso, de pensamentos, os quais eu não queria que algum dia se tornassem realidade.
Temia-me, temia a minha tristeza, o fracasso do meu tímido sorriso, queria-me muito.
Estava a olhar para as palmas das minhas mão, e ali estava a minha vida toda. O meu destino. Como se eu acreditasse nisso, nem nisso nem em profecias, acreditava em poucas coisas. Acreditava naquelas vozes que me faziam estremecer por dentro quando me sentia sozinha. Aquele medo, que não passava de vontade de me ter e de me sentir.
Apetecia-me cruzar os braços, cravar as unhas ombros e deixa-las deslizar suavemente, depois lentamente aconchegar-me, apertar com força a zona abdominal e faze-las subir até me sentir segura. Um estrondo lá fora, a noite faz-se dia durante alguns segundos. As sombras movimentam-se, alteram-se como o meu corpo. O medo apodera-se, os olhos enchem-se de sangue. Há estranhos bailados por ali, o meu corpo dança de pavor, treme de pânico.
Lembro-me de coisa alguma naquele momento, sei que estou, como estava encostada naquela parede, sei que me sinto dormente. O soalho onde me sento, parece estar a dar de si, como eu me quereria dar a mim. Rangia, parecia um gemido, talvez quem sabe de tanto ser passado com aquela cera, dia após dia, ano após ano, vida após vida. O seu magnífico brilho contrastava com a sua traição, fugidio e escorregadio era a forma de ser valorizado, a calma e a perícia e a leveza com que se tinha de andar por cima dele. Eu ao contrário de muitos, preferia manter-me em cima dele horas, ali sentada de pernas cruzadas e puxadas quase até ao meu peito, para que de alguma forma possa encostar de quando em vez o meu rosto aos joelhos. Estava inquieta por dentro, tinha movimentos estranhos dentro do meu corpo, não era os intestinos, nem o estômago. Era eu, os meus lábios estavam quentes, húmidos e estupidamente vermelhos. Mais uma vez a sala iluminava-se durante alguns segundos, em vez de medo nesta segunda vez, fiquei estranha, enervada e cheia de vontades, de me deixar cair para o lado e friccionar uma perna contra a outra e deixa-me.
(…) Estranhamente, sinto-me.


Apeteceu-me


"Nem sempre o nosso lugar está ao nosso alcance". Charles de la Folie

quinta-feira, abril 12, 2007

Não me Lembro de Ser(vir) Mulher




(…) Que vergonha, sentia-me despida de nada em especial. Sentia-me só, sem nada, mas com alguém. – Não entendo o porquê da vergonha, mas ali estava só, sentada em mim mesma, onde me interrogava sobre coisa alguma. Sobressaía nos meus pensamentos, alguns pequenos paralelismos frutos da minha pecaminosa mente, que me traia nos mais ínfimos sentimentos.
Como mulher, não me conseguia definir, como pessoa tinha medo de mim, como ser humano sentia-me animal. Muitas vezes o sangue nas minhas veias fervia, queimava-me o corpo, percorria-me as entranhas, fazia-me rastejar perante aquela estúpida solidão momentânea. Pedia a Deus algo que me saciasse aquela vontade de nutrir os meus pecados. - Parava o olhar, deixava de gesticular, sentia o silêncio. Percorria aquela imagem em circunferências que subiam e se distanciavam, onde a visão cada vez mais alta, mostrava a envolvência onde me encontrava, os vários mistérios que se escondiam perto de mim… a imagem, a minha imagem rodopiava, como se de uma estátua trata-se, numa qualquer exposição.
Quebrava-se o silêncio, o pensamento voltava. Os olhos, os meus olhos estavam vidrados, embargados numa neblina quase simétrica, a realidade estava longe de ser percorrida. Sentia algo a subir-me pelas pernas, pelo corpo, em direcção a tudo e ao mesmo tempo a nada, sentia o corpo a abrir-se, eu abria-me, não sabia a quê, não sabia por ignorância, nem sabia por falta de paladar.

(…) Passei as mãos pelo cabelo. Longos cabelos que retirei da face, enfiei a ponta dos dedos, e deixei-os caminhar, fechei os olhos, senti uma réstia de lágrima misturada com sonhos a serem empurradas por excesso pelas pálpebras ao fecharem. Com as palmas das mãos encostadas ás fontes, fechei os dedos e suavemente fui puxando os cabelos, devagar deixei desliza-las (mãos), aconcheguei com as palmas os olhos, e deixei percorre-las apertando o nariz até passar com os dedos nos meus lábios húmidos.
Senti crescer o meu corpo, apetecia-me acaricia-lo.
(…) Estava desequilibrada, não pelo que me apetecia, nem pela vontade de o fazer. Estava porque, ao cruzar as pernas, deixei-me tombar, muito devagar, até tocar com o cotovelo no chão, ao fazer força para me recompor, voltar a minha postura normal, deixei-me cair até vincar o ombro, e suavemente deixar cair a cabeça sobre nada… foi ai que senti como estava só. Numa tentativa desesperada de me recompor, ainda deitada, olhei para as minhas mãos, senti-as como se fossem parte das minhas vontades. Uma ponta de sangue, sangue real que percorria um dos meus dedos, passei com a língua e senti-me a reciclar, a criar-me e com vontade de me recriar.



Apeteceu-me



"Não me lembro de ser, mas tenho sempre vontade de acreditar". Charles de la Folie

terça-feira, abril 03, 2007

Imagens Mortas

(…) Projectava a sua imagem naquela tela enrugada de tantas vezes ter suportado sonhos de tanta gente. Era uma imagem seca, escura e quase estática. Os movimentos, esses eram construídos artificialmente pela chama daquela vela que se ia esvaindo a cada segundo que passava.
Ontem pela primeira vez entendi o poder da insensibilidade das notícias, a forma como chegam, a sua crueldade, o desespero que trazem, a forma como transformam a vida de uma pessoa, como a controlam e como a desfazem.
Não era a primeira vez que vivia naquela amargura, que aqueles meus lábios secavam de raiva, e se ensanguentava de tanto os morder. Não era a primeira vez que aquela sensação me percorria a espinha que se curvava perante tanta angústia. Era mais um dia que me obrigava a sobreviver, como tantos outros que constituíam a minha insignificante vida. Só não era mais insignificante porque um dia sussurraram-me – que eu era a pessoa mais importante da sua vida. Dessa vida que um dia desapareceu sem rasto – hoje não dou muita importância a esse sussurro, mas por vezes dá-me animo, mesmo que seja falso, que me engane, mas serve para que os meus olhos voltem a brilhar, voltem a sonhar. Mesmo que seja por uma ínfima fracção de segundos.






Gostava de me sentir só, só mas não abandonada aos meus desencantos, só mas não perdida, nos meus enormes vazios.
Ontem quase me recusei a redescobrir-me por medo do que se passou, hoje que quase só quero lembrar-me do dia de ontem, que me esperará amanhã. As minhas mãos tremiam, o meu rosto era invadido por aquele suor, de esforço que não se faz, mas que obrigam os músculos a contraírem-se. Sentia-me fechada, fechada por dentro como se fosse eternamente virgem, como se nunca mais pudesse receber um homem, senti-lo, aquelas carícias estavam terminadas para sempre, temia isso, como temia nunca mais sentir coisa alguma, sentir a verdade dos momentos mesmo que cruéis, tinha medo de tudo e de coisa alguma.
Hoje queria olhar-me mais uma vez para saber se era real, não sabia, podia até nem existir, nem estar por aqui, nem por ali – estava tinha a certeza que estava, a minha desesperança diziam-me que estava, que tudo era real.
Lembrei-me, lembrei-me daquele dia em que sozinha, percorri aquele imenso campo verde em direcção ao infinito, estava descalça, quase nua, sentia o vento preencher-me o corpo, acaricia-lo e torna-lo vivo, lembro-me dos orgasmos que tinha quando me sentia envolvida em mim. Tenho medo que esses dias que teimam em não voltar, que esbarram em pensamentos nada dignos não voltem. Ao fim ao cabo quem ainda tem uma pequena esperança, quer dizer que está viva, mais ou menos viva.
Perdi-me, perdi-me em varias conversas quando entrei naquela sala com a vela na mão, e vi aquele velho ecrã. E ai pensei sinceramente que era uma pessoa com sorte, poderia ter uma vida enfadonha que não tivesse sequer tempo para imaginar histórias sem fim.

Apeteceu-me


"Por vezes alguem tem de se perder para ser novamente encontrado". Charles de la Folie

terça-feira, março 20, 2007

A Porta.






(…) Há 40 anos que aquela porta não se abria. Era um momento de algum nervosismo. Naquele instante bastava esticar a mão, meter a chave na ranhura… e depois com o pulso, rodar aquela maçaneta de madrepérola para a direita… e empurra-la.
Lá dentro, ninguém sabe ao certo o que lá poderá estar, além dos cheiros que se acumularam ao longo de tantos anos, e do pó, e dos bichos, e das lembranças, e de sei lá mais o quê.



(…) Tão nova, tão bonita, tão… mantinha-se naquele quarto quieta em silêncio, com um olhar terno fixo numa qualquer esquina, de uma rua não muito movimentada, mesmo ali. Lá estava como todos os dias de cotovelos fixos no parapeito, mão a abraçar e apertar a face até ruborizar as maçãs do rosto. Os pés entrelaçados um no outro batiam ritmos ao som do silêncio. Os cheiros sóbrios a alfazema da sua roupa cruzavam-se com as cores garridas dos seus pensamentos.





(…) Ao mesmo tempo que olhava para aquela maçaneta de madrepérola, pensava em milhentas coisas. No fundo do seu bolso, procurava a chave que abria aquela porta. Com o sobrolho franzido como que faz alguma ginástica mental para conduzir os seu dedos entre lenços engelhados de tanto uso, papeis de rebuçados, algumas moedas de pouco valor e uma medalha que tinha achado a porta da mercearia quando foi comprar alguma bolachas a peso.


(…) O seu nome Liberdade, contrastava com a sua clausura naquele quarto. Aquele olhar era a porta para os seus males. Era ai que se libertava com os seus pensamentos, das vontades impostas, da sua condição feminina de quem estava prometida a ninguém. Realmente essa era a verdade nos seus pensamentos não cabia lá ninguém obrigado. Tudo o que coabitava com ela, vivia em harmonia com o seu próprio mundo que cá fora tinha o nome de utopia.


(…) O metal da chave roçou-lhe pelos dedos, puxou-a, atrás com a imensidão de coisas que se iam acumulando ao longo de dias, veio o próprio interior do bolso de uma sarja muito fininha. Tentou alinhar a chave na sua mão para poder abrir aquela porta encerrada nos tempos e que lá dentro teria no mínimo uma mão cheia de nada.
Nervoso, enterrou a chave na fechadura, como quem crava um espada pelo corpo e rompe a carne. o barulho em nada semelhante provocou um arrepio muito parecido com tremor de terra.




(…) Naquele dia, quando no único momento em que desviou o seu olhar da rua. Fixou durante algum tempo a porta do seu quarto que estava fechada, mas não trancada. Percebeu que as marcas da madeira afinal não eram mais que marcas de tempo, tempo passado na floresta ao sabor dos ventos, do sol da chuva, eram as suas marcas que tinham parado no momento em que foi ali posta (a porta).

(…) Com a mão direita rodou a chave para a direita, duas voltas depois, rodou a maçaneta de madrepérola, para a direita também mas com a mão esquerda.
Respirou fundo uma vez, respirou fundo uma segunda vez, e uma terceira.
Na altura em que encostou o joelho a porta para poder auxiliar a abrir, teve um calafrio e uma sensação de dejá vu. Respirou então fundo pela última vez.

Apeteceu-me




"A Vida é a pior das doenças, leva-nos sempre a Morte". Charles de la Folie

terça-feira, março 13, 2007

Panóplia

(…) Não me lembro do dia em que senti toda a verdade do meu corpo.
Parecia querer rebentar. As dores abundavam, percorriam-me de cima abaixo, como se uma machadada bem media tivesse sido desferida com a violência de 100 ódios. Fragmentei o meu corpo, mas sabia que tinha de conviver com ele até ao fim dos meus dias.


(…) A Razão estava do lado dela, estava! Toda a gente sabia disso, mas nunca ninguém ousou perguntar, qual a razão! Era difícil entender a forma diferenciada da razão, mas ela subsistia sobranceiramente sobre todas aquelas cabeças que emanavam conhecimentos tão diferente como a própria razão que teimava em deitar-se numa cama que não era a dela.


(…) Aquela dança era quase tribal, não era de tribo, nem de “ porra ” alguma. Era simplesmente uma dança simples, sentida, que se resumia a isso mesmo: - uma dança
Aquele corpo sucumbia aos sons que saíam pela sua alma, e lhe faziam estremecer os seus próprios prazeres. Recebia por cada passo uma nova salva de acordes que se confundiam com gemidos de…


(…) Já se sabia mesmo antes de acontecer, era quase inevitável que tal não sucedesse!
O ar estava carregado de nuvens negativas, as suas descargas recaíam sobre coisa alguma, mas estavam lá prontas a ser disparadas contra nada. Era a história do vazio, do bacoco e daquilo que realmente não interessa. Por outras palavras era a história da vida dos outros.



(…) A música que saia, era inconfundível. Eram melodias a roçar o celestial, se é que isso existe. Havia a musica da Celeste, que não passavam de pequenas cantorias, inventadas no prazer da brincadeira com os seus amigos invisíveis e indivisíveis. Cantorias cantadas em tom desafinado, que soavam a pequenos deleites de ternura.

(…) Estava ali sentado, sobre si mesmo. Cotovelos vincados no ventre, mãos bem abertas sobre o rosto. As nádegas resfriavam naquela pedra fria, que fazia as tripas andar num virote. Encolhido, pensava nos dias que ainda restavam, para o fim da sua ainda curta vida. Pensava em tudo o que não fez e que não sabia se algum dia ia conseguir fazer… mas pensava.



(…) Ontem descobri que me faltava viver o dia de amanhã. Descobri que o dia que ontem passou, já não existe, que os erros perduram mesmo que se corrijam. A nossa imagem desgasta-se como o pensamento, desvanece como as tempestades, mas que é forte como … Senti isso ontem quando preparava aquele enorme salto para descobrir se sou eterno.


APETECEU-ME


"Ontem revi-me no meu pensamento, senti-me falso no meu olhar". Charles de la Folie

terça-feira, março 06, 2007

Magia da Lua







(…) Sentada, naquela pedra fria perto de tudo e de nada pensava em ti!
Estava uma noite, bonita, de temperatura amena, com um pequeno sopro de vento, que mal dava para despentear os já muito desalinhados cabelos, de tanto passar com as mãos. Não sei se eram afectos em causa própria, mas gostava de passar as mãos pelos meus longos cabelos e senti-los a escaparem-se entre os dedos, agarra-los, puxa-los, e com a ponta, fazer pequenas massagens no couro cabeludo.
- Parecia magia, lá longe na imensidão do aquém, na infinidade do nada. Acendia-se uma luz, que não era dela, mas que também não era importante, não ela, mas a luz. Ela era mais que importante, era essencial ás pequenas coisas doces que a vida nos dá. Pensado bem era essencial a tudo o que a vida nos concede, – quantas vezes dei por mim a carpir mágoas com ela!? Quantas vezes me senti apaixonada por ela?! Quantas vezes senti a sua magia entranhar-se no meu corpo em forma de arrepio!?
















Estava a ficar com o corpo dormente do frio da pedra a entranhar-se por mim, era normal. Não era normal era estar com a mente empedernida de tanta beleza. Os pulmões respiravam a uma intensidade quase ciclónica. Os meus peitos quase rebentavam os botões da minha camisa branca de popelina, tão cintada que me deixava a barriga lisa e definida, atleticamente precisa.
Os meus lábios, encarnados de prazer, húmidos de deleite, os olhos vidrados de tanto deslumbramento. Mas sentia a minha linguagem corporal a balbuciar palavras sem sentido aparente.











A minha frente, mas bem lá em cima “Ela” dançava, uma dança estranha. Muitas vezes acompanhada por véus estranhos, umas vezes opacos e escuros como brancos e transparentes.
Gostava de a sentir, sentia a dentro de mim, sentia como as marés, como fluxo e o refluxo da imensurabilidade dos mares que se curvam no horizonte perante ela.
Naquela altura estiquei os braços bem para cima, juntei as mãos, entrelacei os dedos, voltei as palmas das mãos para cima, e espreguicei-me como se a estivesse a empurrar, respirei fundo:
- Fiz mais uma vez aquele movimento para sentir a camisa a passar pelos extremos dos meus seios. Senti um enorme arrepio a entrar-me pelas entranhas. Percorreu-me pelo corpo um ligeiro suor, que se agarrou ao corpo e libertou aquele cheiro de amor e paixão. Foi ai que senti mais uma vez a magia da Lua.








Apeteceu-me








" A Vontade de dizer, perde-se na alegria de olhar". Charles de la Folie

terça-feira, fevereiro 27, 2007

(Não) Há Vaga por ai…

(…) Sentia-te a vaguear pelo meu corpo, ocupando os espaços das minhas formas.
Sentia o teu perfume marinho, o teu refrescar sincero entre os meus prazeres.
Tudo parecia fechar-se sobre o momento, o céu, as nuvens, os pensamentos que por ali se refugiavam. O teu bater quase sistemático arrastava vida. Empurrava-as para fora e para dentro, nos limites do aceitável.
Um dia gostava de te compreender, de lidar com as tuas incongruências, com as tuas contradições absurdas. Como tanta beleza comporta tão mau feitio, e como tanta ternura consegue ser tão cruel.




Descobri em ti algo que vai muito além da compreensão, a tua pureza, gosto quando abraças o meu corpo e me embalas, mas também sei quando me queres fora de ti.

Perdi-me, perdi-me quando pensei que seria possível resistir-te, aos teus encantamentos. Hoje penso que é “possível” essa impossibilidade, penso, porque irracionalmente quero-te tanto, como ninguém alguma vez te quis. Não sinto as traições, não as sinto nem as quero, talvez por isso nos respeitamos mutuamente, tu não me agrides e eu não te desafio, ou eu não te desafio e tu não me acometes.
Estou acordado, sei que estás perto, consigo-te ouvir e assim acariciando com as palavras que levo no meu pensamento.



-Quando me expulsas ferozmente pela falta de respeito a tua privacidade. Ontem ouvi-te murmurar a noite inteira, não te consegui entender, mas percebi que estava feroz e enraivecido, ouvi-te a bater contra tudo e todos, a galgar tudo que encontravas pela frente. Nunca me aborreço de te ouvir, nem mesmo quando estás assim irritado, era capaz de jurar que seria incapaz de me divorciar de ti se um dia estivéssemos unidos por uma aliança, mas não, não te costumas aliar a nada. – Nem mesmo a mim.




Claro que não sou singular, nem o pretendo ser, mas adoro quando me deixas galopar contigo na tua crista, por vezes tão perfeita que me esqueço que afinal o mundo não somos só nós, mas poderia ser, o meu pensamento, muitas vezes reduz o mundo a nós dois.


Apeteceu-me

"Dar e receber não é o mesmo, mas pode ser igualmente importante". Charles de la Folie

sábado, fevereiro 17, 2007

Câmara Municipal de Almada e Junta de Freguesia da Costa de Caparica - ora Porra

Que se lixe a Cultura, até o Hugo Chavez já percebeu que a Cultura não dá comida a ninguém. A câmara de Almada continua a apostar em algo que ninguém entende, se a dada altura andou a frente de muitos municípios portugueses… nesta altura anda na cauda… A Costa de Caparica além de ser dos sitos mais caros de Portugal em termos de habitação é também um dos sitios mais caros no que diz respeito ao cabaz(que faz a inflação).
A Sra. Presidente da câmara de Almada continua a ignorar a Costa que nesta altura não passa de um entreposto de marginais e ilegais.



3 de Maio de 2006

O DN (ainda com António José Teixeira como director) noticiava :

- “A Câmara de Almada começou ontem a demolir um aglomerado clandestino de barracas na Mata de Santo António, Costa de Caparica, para ser construído um amplo jardim e habitação social, ao abrigo do programa Polis.

O vereador da Habitação Social da autarquia de Almada, Rui Jorge Martins, disse que a primeira barraca foi destruída de manhã, prevendo que, até ao final desta semana, sejam destruídas as construções de 120 famílias. O autarca acrescentou que, até ao início de Junho, serão removidas as barracas de mais 181 agregados. Ao todo serão realojadas provisoriamente 301 famílias nos bairros sociais da Quinta do Chegadinho, Feijó, e do Plano Integrado de Almada, Monte de Caparica”.


Estamos em Fevereiro de 2007 e este é o cenário:

Uma enorme favela está a erguer-se nas terras da costa… um belo cartão de visita para quem quer uma Costa de Caparica turística.






As casas nascem como cogumelos, mas a Camara Municipal de Almada continua a ignorar o que se passa, dá-se ao luxo de responder aos Mail's a dizer que não sabem de nada, e que vão averiguar.
Não é de admirar a nova classe politica os "arguidos municipais" estejam a proliferar.




É esta uma das portas da Capital de Portugal. Turismo para a Costa de Caparica? será possivel!? Estou a imaginar pagar um balurdio para ir passar uns dias a algum lado que tenha este cartão de visita, era meio caminho para processar a agencia de viagens.
Também duvido que algum pais deixe (i)migrantes, sejam lá eles oriudos de onde fazer o que se faz por cá.



É como deixar uma praia morrer ao abandono quando se sabe que há problemas graves. Não chega dizer que a culpa é das várias entidades que a tutelam, INAG'S e coisas do genero, há que ir a luta, mas não.
Não chega chorar perante as camaras de Televisão, no dia da desgraça, porque o problema é antigo.
Como é possivel que uma Camara que se diz Comunista... deixar cobrar entradas a uma entidade que por acaso é parceira numa data de obras públicas com a Edilidade. Imaginem o cordão dunar a ser derrubado, e os fulanos a cobrar 2,5€ aos jornalistas. - Não me parece (nada normal).




Também não me parece (nada) normal numa Camara que preveligia a Cultura e a Educação e no seu concelho tenha (ainda) escolas ainda com telhados em Lusolite.
Pois pelos vistos as tempestades só não despeiteiam o tão arrumado cabelo da SRA. presidente da Camara de Almada.



Faz-me muita confusão, Almada estagnou, mas as pessoas continuam a dizer que culturalmente é uma cidade evoluida, onde? conseguem-me explicar?
Conseguem-me explicar porque a Costa é Cidade? E o que faz o Presidente da Junta além de chorar a frente das camaras (não as municipais)?
Porque será que continuam os parques de campismo por aqui? porque será que também o inatel fecha acessos a praia?
Nós que vivemos aqui e que "alimentamos" durante o inverno a "cidade" não teremos nós direitos? ou será que só servimos mesmo para pagar?

Apeteceu-me

"Podemos acreditar que somos grandes, mas o poder deve ser utilizado em beneficio dos outros nunca em nosso". Charles de la Folie