quarta-feira, abril 21, 2010

Vidas (Em)cruzadas) - Ressacas I

Está na hora de acordar, são 8 e 30 da matina, este despertador teima em ranger, tinir-me aos ouvidos, tolda-me a pouca sobriedade que ainda me resta, se é que há ainda alguma, mas, mesmo assim, consigo dirigir-me para a casa de banho, mesmo com os olhos semicerrados.
Há aqui qualquer coisa que não faz sentido. Olho-me ao espelho e continuo a dizer que há qualquer coisa que não faz sentido neste cenário meio dantesco, sim meio dantesco, meio qualquer coisa estupidamente terrível. A cabeça parece que vai estoirar, os olhos ardem-me, as pernas bamboleiam, o cheiro a “sarro” parece o fundo de uma vasilha de vinho. É imundo, um cheiro que não dá para acreditar, nem aguentar, eu não aguento, não consigo aguentar o meu próprio cheiro!
Mas a imagem do espelho continua esquisita, mesmo muito esquisita e deturpada, enviesada, está estrambótica ou estrambólica. O que está na boca parece… não parece, é mesmo, uma meia, a mais sublime e proeminente “peúga” do meu pé sagrado, oriunda de uma noite sabe-se lá como… de dentro do meu humilde e sinistro sapato.
Hummmmm!!... Estranho, muito estranho mesmo, uma peúga na boca!? E a outra?! Bom, a outra terei de a procurar se não quiser ir sem meias para o emprego. Emprego?! Será trabalho?!
O que quer que seja não estou na disposição de ir trabalhar neste sábado (mentiria se dissesse primaveril, com muito sol e os passarinhos a cantar), mas… sempre um mas… nestes dias de ressaca. Não sei se trabalho, se tenho um emprego e muito menos se o faço ao sábado, aliás nem sequer me lembrava ou lembro a quantas ando ou andava, a minha gramática não está a jogar na perfeição, tal foi a “tosga”... Nem as janelas abri, nem as persianas levantei, nem os olhos.
Aliás, nem sei se ainda estou a sonhar!
Apetecia-me urgentemente um café, mas antes terei de usar sabiamente, manipular… sei lá bem a definição para esse acto, de usar o bendito “guronsan”. Chamem-lhe o que quiserem, eu vou apelidá-lo de um acto divino capaz de me dar uma visão da realidade que por momentos me parece assustadora, por vários factores.
Primeiro, não encontro a cozinha, segundo, tenho de encontrar os ditos “guronsans”. Porra, o que é isto!? …
(Eis que tropeço no cão que nem sabia que tinha, bato com a cabeça na parede que não sabia que estava ali, e acordo dois dias depois no hospital.)
Era uma sala branca, meio esquisita. Naquele hospital sentia-me nauseado e estranho, aquela sala era demasiado esquisita mesmo para ser uma enfermaria, demasiado “familiar”.
Hmmmm!!… Realmente não me sai da cabeça que já tinham passado dois dias. Descerrei os olhos com uma dor de “cachimónia” infernal, estes olhões verdes, meios esbugalhados a olhar para mim, são uma imagem divina, será um anjo, uma fada, é assim, como se costuma dizer lá na minha terra, “dos Deuses”, mas ia-se fazendo luz, faz-se luz, talvez se faça alguma coisa, será mesmo!? Ao que me discorre destes neurónios tão maltratados, muito mesmo, não me lembro que anjos ou fadas tenham olhos verdes, lembro-me sim que os anjos não têm costas e que não se pode dizer qualquer coisa sobre as fadas, porque morrem, ou será bater palmas?! Devo andar a ver muitos filmes para adultos de meia tigela, pois, porque os adultos de tigela e meia são, pois são, não duvidem mas são, o quê… é que já não me lembro… talvez um dia o descubra.
Há aqui muita coisa estranha, uma delas é, como é que acordo dois dias depois… ainda por cima num hospital, e ainda estou de ressaca? Estranho não?! Até podia ter uma carrada de coisas meio partidas, ou partidas inteiras o que é difícil, mas eu sou o rei dos impossíveis, mas de ressaca ainda…eu apanho ressacas, algumas ainda em andamento, mas assim!?
E esta enfermaria, ou esta sala de operações tem algo de comum com a minha cozinha. Curioso… um bocado de casca de ovo colado no tecto, igualzinha à decoração lá de casa! Como costumo dizer, aqui só falta mesmo o Calimero.
Estou maldisposto, enjoado também, terá sido quiçá de alguma anestesia experimental, terei assinado algum documento que dissesse para fazerem experiências comigo?! Meu Deus, sou um zombie, ajudemmmmmmm-me… calma, calma… vou respirar fundo. Seja anjo ou lá o que lhe valha, a portadora, ou portador daqueles olhões verdes tem um mau hálito, de bradar aos céus, danado mesmo… como diz, alguém que… ok eu já me lembro!(...)

Apeteceu-me


"Os dias apenas passam por nós, não nos matam" Charles de la folie

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