terça-feira, agosto 17, 2010

Vidas (Em)cruzadas) - Pancada VIIII

Aquelas palavras ecoam-me ainda na minha humilde cabecinha (...)

-Sabem?! Ontem estive com a Palmira.

-OHHH, então? (em coro)

-Nem sabem o que aconteceu!

-Conta!... (em coro)

-Estive com a Palmira, e...

-Foi?! E?... (em coro)

-Nus!

-Nus?!... (em coro)

-Sim, e foi muita bom, até deitei... Sabem?... Não sabem?!

-Ah vieste-te? - diz um ou uma mais esclarecido ou esclarecida.

-Vieste-te?! (em coro)

-Sim, vim a pé, como é normal, o meu pai tem o carro na oficina.

-(riso geral) Ah! Ah! Manganão, conta lá, não disfarces - diz o mais esclarecido.

-Sim, sim pois claro e depois, sabem, foi sempre a abrir.

-E a Palmira? (pergunta geral)

Aquela conversa foi para mim tão absurda, que ainda hoje tento perceber o tipo, tentar tento, mas não consigo!

É óbvio que eu naquela altura, até demorava a carburar, a pensar no assunto,realmente a perceber o que acabava de ser dito ali. Fartei-me de gozar o pagode, tipo cá de trás da multidão, e se era uma multidão estava mesmo muita gente, a escola quase em peso... Olha então quando o assunto era uma menina, nem queiram saber!

Eles,para saberem pormenores, elas para poderem ter trunfos contra a concorrência,ali valia tudo, aliás se há sítio competitivo para o qual nós não estamos preparadas é o Secundário, vi-me e desejei-me, mas sobrevivi. Da fama daquele energúmeno é que não me safei, mas naquela tarde e perante aquela assembleia, eu mandei umas bocas valentes:

-Então Garanhão há gaja!?

Eu cá de trás, escondida em tom provocador, muito mesmo.

-Era perfeita, umas mãos magníficas.

-Porquê és manicura, arranjaste-lhe as unhas?

-Pois, pois...

Dequem não tem resposta, e o sorriso amarelo, só visto.

-E descobriste-lhe o ponto G?

Estafoi para o matar, ainda hoje me rio da resposta dele.

-Sim, sim, estava difícil de o tirar, mas consegui. Aqueles cintos da Gucci sãomesmo difíceis, mas têm aquele pontinho em cima do "G" ...

Alie acolá ouviram-se umas gargalhadas estridentes, claro só mesmo algumas miúdas perceberam a pergunta e entenderam a cretinice e imbecilidade da resposta.

-Tocaste-lhe o clítoris?

Esta ainda foi mais maldosa!

-Sim toquei, ainda tentei tocar Led Zeppling, mas ela odeia música pesada.

-Tentasses uma música mais levezinha.

-Pois, não tentei, devia?! É que eu só tenho olhos para a Palmira...

Já não me lembro bem do resto, sei que me ri... que chorei a rir, acho que me mijei a rir e que andei muito divertida, super divertida o resto da tarde, só quedepois comecei a sentir aqueles olhares de, como explicar... um misto dedesaprovação e de heroína, mas também um misto de desavergonhada com tarada sexual. E comecei a tomar as proporções da coisa, já era mesmo coisa pública e começou a remoer, a remoer, uma moinha nesta minha humilde cabeça... A cólera e araiva começaram a tomar conta de mim e isto numa rapariga de 14 anitos,imaginem!

É...Eu tinha os meus defeitos, como toda a gente, era traquina, mas tinha alguma consciência e, aquilo, aquela história começou a cair-me muito mal, a provocar azia e de que maneira.

A caminho de casa, não como sempre, evitei ir com o Pilitas e com o Vasco, fui a matutar na vingança, como havia de me vingar. Pensei em quase tudo, até empurrá-lo do alto do nosso prédio, mas coitadas das pedras da calçada!

Ao virar a esquina... vi, ao fundo da rua, a conversar, o Pilitas e o Vasco. Eles estavam de costas para a entrada do prédio. Achei que aquele era o momento e não me ocorria nada... É que não me lembrava de nada, estava bloqueada. Ali antes do prédio havia e há uma loja de electrodomésticos que é do Tio do Pilitas, ali, na zona da porta costuma estar sempre e naquele dia não foi excepção, uma pequena exposição dos produtos da loja. A única coisa que se pegou à minha mão e com uma boa base de lançamento foi uma daquelas panelas de pressão com uma pega grande tipo frigideira, ora a tampa parecia mesmo à medida dos meus intentos. Escapuli-me para dentro do prédio, sem me verem, foi difícil, mas consegui ficar transparente tal era aminha raiva. Quando eles entraram só me lembro que ainda travei o meu ímpeto a tempo de... porque... pois porque se não tinha sido a minha desgraça.

Travei a tempo, salvo seja, a "carrapeta" em ferro, com o balanço, saltou e pimba, 6 pontos no toutiço... A partir desse dia, conversas com ele nunca mais, claro sócom o advogado da minha mãe como nos filmes. A verdade é que nunca mais conversei com ele, também é verdade, que nunca o perco de vista, nem posso! Há entre nós um misto de Amor-Ódio, uma química infernal, sei que ele também tem o mesmo sentimento, também sei, das peripécias que faz quando anda mais nostálgico... Não... não são essas, de falar alto pelos corredores e pelo prédio quando sente a minha aproximação, começar a dizer disparates para ter a minha atenção, diz cada coisa mais ridícula... No outro dia, eu nem me lembro bem,aliás, eu... eu mesma até fico envergonhada, mas disse uma patacoada do género...quase que pareciam duas, tipo a falar sozinho, como os malucos, uma conversa de surdos, mais de malucos... assim, mais ou menos... - Meu Deus porque me fizeste tão belo?

Ou então:

-Não sei se estou farto de ser belo, se estou farto de ser loiro.

Claro que deve estar belo, ele é moreno até à quinta casa e de belo só se for um belo cabaz de cornos, isso sim, isso é que é beleza.

Apeteceu-me



"Apenas por uma vez descobri que havia outras vezes para olhar a vida" Charles de la Folie

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