terça-feira, março 21, 2006

CORPOS




(…) Ali a respiração esbarrava na solidez do ar que o rodeava. Estava um dia lindo. Um rapaz com os cotovelos apoiados no mármore que rematava aquela varanda, olhava para além do horizonte. Via-se no fundo dos seus pensamentos, dos seus sonhos da sua imaginação, conquistava ai os monstros que no dia a dia o venciam.


(…) Do outro lado do mundo, uma rapariga deitada sobre si, sobre os seus cotovelos, apoiava aquele queixo frágil de traço único sobre aquelas mãos delicadas, com unhas que cegavam com o seu brilho. Uma espécie de fio da navalha que encandeia ao sol. Ela com um ar descontraído olhava para um quadro, uma paisagem de um horizonte longínquo, de um pintor desconhecido mas que emoldurava a sua maneira de pensar e de sonhar, um traço único de uma rapariga que nunca conheceu a vida, a dura vida que acreditava existir num qualquer local longe daquele quadro.


(…) Algures num qualquer recanto de um pais atravessado pelo Equador, uma criança saltava sorrindo atrás de uma miragem que nunca conseguia alcançar. Cada vez que parava, via-a, olhava-a, pensava e sonhava que um dia ia ser como a miragem que desconcertava a sua imaginação e descontrolava todas as manhãs o seu acordar. Ali o Sol era como a chuva, chegava de uma forma arriscada e inexplicável, tal como os sonhos.


(…) Sentia todo o corpo a congelar, mas a sua curiosidade era mais forte que a dor. Dor talvez fosse forte de mais para explicar a sensação de andar perdido no gelo, na neve do fim do mundo. Ali o branco coincidia com a absorção dos dias complicados que passara na grande cidade, como um mata-borrão. Consoante o frio se apoderava do seu corpo, as decepções da vida iam desvanecendo. Passo a passo ia subindo aquela ilusão e morrendo a sua desilusão.




(…) No palco olhava para a multidão como se nada existisse. Estava só, sentia-se só. As palavras saiam-lhe, a musica ecoava por cantos que nem ela imaginava. Parecia mecânico, parecia não era. Ali naquela porta do tempo onde pouco ou nada importava a musica não passava de um enorme vazio de sons, as palavra um enorme vazio de qualquer coisa de difícil digestão.


(…) O tempo corre para um lugar qualquer, foge-nos. As várias tentativas de o agarrar, são frustradas, é eficiente amadurece e corre. Um dia lá o encontraremos sossegado no canto para onde corre, para onde foge, para aquele horizonte onde os monstros não nos vencem. Descobrimos que está dentro de uma pintura que ninguém reconhece, no meio de uma linha imaginária que nos corta ao meio. O tempo congela-nos a alma, mas não a corrompe, esse é o nosso papel.
O tempo é o palco de uma vida que temos de viver por meio dos sonhos que nos atravessam.

Apeteceu-me

"Ele vai e volta e nunca chega ao mesmo tempo que a vida" Charles de la Folie

16 comentários:

Poesia Portuguesa disse...

Surpreendente! Gostei!

Um abraço e boa Primavera ;)

Carla disse...

"O tempo é o palco de uma vida que temos de viver por meio dos sonhos que nos atravessam."

Gostei muito de ler :)
Obrigado pela tua visita ao meu Querido diário, serás bem vindo sempre que te apeteça :)


"Um Momento... Um tempo..."
Há recordações que merecem ser lembradas
Mas o passado, não se pode viver no presente
O presente é um tempo novo!...

"O Momento... No tempo..."
O Presente de um momento
É um segredo que o tempo futuro esconde...
By ≈©≈Ňąd¡®≈©≈


Bjx

BlueShell disse...

Tinha saudades de te ler. Jinhios, BShell

pisconight disse...

Boas!!

Adoro cá passar para me deliciar com a tua escrita. Se há coisa que gosto de fazer ( e faço muito bem) é sonhar, embora por vezes sonhe acordado...

Um abraço.
;)

augustoM disse...

O tempo é o palco de uma vida que temos de viver por meio dos sonhos que nos atravessam, ou a vida é um livro em branco onde vamos escrevendo, e os sonhos ficam invisíveis.
Um abraço. Augusto

O Micróbio II disse...

O Micróbio fez anos!... :-)

Unknown disse...

Olá amigo faz tempo que não te visitava, mas continuas fantástico sem perdera qualidade. Beijinhos e gostei de te ler

Su disse...

como sempre é um prazer ler.te

jocas maradas

Hipatia disse...

Isto andava tão caladinho por aqui que quase perdia este texto, não fossem os parabéns que vim agradecer :))

Esther disse...

Oi, Carlos..Adorei tua presença do outro lado do mar...Ela foi marcante de início...Estarei por aquí Bj!;)

AR disse...

"Apeteceu-me" parar por aqui. E gostei do tempo que aqui estive. Assim sendo, vou voltar.

Abril disse...

Con esfuerzo te leí, y te continuaré leyendo... saludos y cariños siempre.

BlueShell disse...

Gostei de ler sim, senhor!
Aceitas um beijito?
BShell

BlueShell disse...

Ainda que mal pergunte...Onde raio te meteste?
Já te disse que gostei de te ler...que mais queres?
Ai não apareces?

Mas que coisa....

Avó do Miau disse...

Texto lindissimo, imagens fantásticas, gostei imenso do seu post!
Um abraço amigo,
Daniela Mann

Ariadne disse...

"as coisas que nos somos e não sabemos"? Não entendi essa (rs)!
Belo texto!
Um abraço