terça-feira, junho 29, 2010

Vidas (Em)cruzadas) - Pancada I

Capítulo II - Pancada

- Mãe, Porra, já basta… já estou acordada que Merda… já não chega o raio da dor de cabeça que tenho e ainda vens para aqui pôr-te aos beijos a lambuzar-me toda?!
Se há coisa que odeio é ser acordada com beijos. Odeio, a minha mãe sabe disso e passa a vida a fazê-lo…Guardem os beijos para… sei lá… para… para… para um dia mais tarde recordarem ou coisa do género. Para quem haviam de servir os beijos… Os beijos… cada vez que me lembro de beijos… Terei eu a culpa de acordar assim? Acho que não! Feitios são feitios, ou será que não?! Mas cada vez que me lembro de beijos, lembro-me de cerveja, de imperiais, da espuma a cair alarvemente no balcão e a escorrer pelas mãos… Uma pessoa sorve ruidosamente e fica-se com aquele bigode branco que rapamos com a língua e depois olham todos para nós, com aquele ar de desaprovação, e só nos apetece, logo a seguir, arrotar à camionista e despenteá-los a todos. Eu sei que fica mal numa menina, mas que se lixem, alguns… para não dizer todos.
Que horas serão? Dói-me a alma para olhar seja lá para o que for. Que chatice, já são oito e meia da manhã, que grande porcaria… Até estou com medo de subir as persianas, pior mesmo que beijos é levantar as persianas de repente e levar… “levar” é bom, até que me apetecia… mas, dizia eu, levar com aquela luz toda de uma vez só nos meus olhos, parece o milagre de Fátima, cheio de cor e luz. Do milagre de Fátima precisava eu agora… pois precisava e de que maneira, até agradecia. A minha cabeça gira que gira…
Mas o que preciso agora mesmo é de uma velinha em honra e memória de Nossa Senhora dos Gregos ou será do Gregório? Se não é deve ser de coisa parecida. Que enjoo, estou mesmo enjoada! Grávida, garanto-vos que não estou, só se foi obra do espírito santo, quem sabe… quem sabe… sei eu, ora que coisa! Se não for eu quem saberá? Só mesmo eu e se eu digo que não estou, é porque não estou. Preciso é de muita calma e paciência que a coisa não está nada famosa e pior... pior mesmo é que ali do outro lado… só ouço…
Pois do outro lado só ouço a minha mãe a zurzir, praguejar e outras coisas que nem me quero lembrar. Anda ali, de um lado para o outro, a dizer: “a Palmira isto, a Palmira aquilo”… Arre! a Dona Henriqueta ainda me gasta o nome, de tanto andar para ali tipo uma barata tonta, é o que parece, pelo que sinto, mas o que sinto mesmo é uma enorme vontade de… Que engraçado e ao mesmo tempo que estranho… sempre me lembro de tratar a minha mãe por Dona Henriqueta, porque será?! Pois sei lá, também nunca ninguém me explicou porque é que o Stevie Wonder não podia ver o Ray Charles, eles que até parecem pessoas simpáticas, porque terão assim um ódio tão grande um pelo outro?!
A minha cabeça anda num corrupio ou antes num inferno. A noite foi de borga, uma grande borga mesmo, mas o mais curioso é que não me lembro porquê, estou, com uma estranha sensação… Bolas, até mesmo o “Cérbero” está completamente entorpecido.
Lembro-me que é sábado, que tenho qualquer coisa para fazer e não sei bem o quê!? Trabalhar não é de certeza, emprego não tenho, fundo muito menos… fundo de desemprego claro, é que não faço a mínima ideia do que é trabalhar, quer dizer, eu lá no fundo até sei, mas óbvio é um fundo tão… mas tão… longínquo que não o quero imaginar… Bom só se fosse nu, mas nu quem? Acho que ando a ficar com alucinações muito complicadas, terei eu andado a tomar alucinogénios, ou lá como chamam a essas coisas que nos dão, para andar aí a imaginar coisas esquisitas…
Grande pedrada que eu ainda tenho em cima, tenho e ao que parece é para manter, quer dizer mantenho não por opção, mas porque… ai nestes dias tudo o que me vem à moleirinha é disparate, se não é disparate anda lá perto, ou então é dor, ora dor por dor… prefiro o disparate. Eu sei que a maior parte das pessoas dificilmente consegue compreender o porquê de uma rapariga dizer e fazer tanto disparate, não é pelo disparate, é pela rapariga em si. As pessoas não conseguem conceber nem imaginar isso no seu reino cinzento, ou no seu meio palmo de testa, pois uma rapariga dizer disparates e fazer disparates… Ah! e muito menos, já me esquecia, a “enterrar” uma panela pelos “cornos”, pode ser “chifres”, fica mais bonito uma donzela dizer assim, mas fica melhor pelos “cornos” de um gajo abaixo. A história do Vasco fica para outras núpcias… “péra” lá! Eu disse núpcias?! Pois, ora núpcias, núpcias está-me a tentar dizer qualquer coisa, mas... não chego lá por enquanto, nem por enquanto, nem por nada, não chego e “prontos”.
Eu, quando estou assim, não é que tenha estado assim muitas vezes pelo menos esta semana, eh! eh!, mas quando estou assim… ai ai… Antes de conseguir abrir os olhos, todos remelosos, gosto… adoro… sinto-me mais aconchegada assim, de barriga para cima, quer dizer, deitada de barriga para cima, não quero que ninguém pense em coisas esquisitas. Barriga para cima, pernas abertas, braços a agarrar na almofada para a poder puxar para cima até me tapar as orelhas, é a maneira de eu não sentir nem dores nem o quarto a andar à roda, parece um carrossel, anda que se desunha. Quando este meu quarto lhe dá para isto, só me apetece dizer coisas ruins, mas ele não me liga nenhuma, é um safado, um grande cafajeste isto para não dizer já aqui um chorrilho de asneiras.




Apeteceu-me
"Não há lógica na irracionalidade do pensamento, apenas temos de aprender a deixa-lo ficar" Charles de la Folie

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