segunda-feira, outubro 22, 2007

Utopia


(…) Gosto de me projectar para uma mundo diferente. Não foram poucas vezes que me vi diante um público entusiasta a olhar os meus saltos em tudo magníficos. A minha elevação o meu poder de me fixar e permanecer no ar. Ou um pequeno chassé, que espelha nos meus pés a vontade de voar em pontas de fogo. O meu corpo quente de vontades, permanece em movimento para arrefecer o desejo que me percorre. Gozo o meu corpo vivendo tudo o que não posso nem consigo. Sonho com o corpo que não tenho, vejo-o de forma diferente. Deste que é meu, saem projecções de mim, que se reflectem no meu gemer.



(…) Não sei de quem é o barco que me leva. Gosto do vento que me afaga o corpo e me arrepia. Sentir o rasgar do mar, como quem rasga um corpo com as unhas. Olha-lo no fundo, no horizonte. Perder de vista o tempo, com que medimos os sulcos da nossa pele. As curvas com sabor a sal. A temperatura com odor ao meu prazer que desce de, e em mim. Sentir-me acompanhada, com a personagem que se reflecte na água verde sem esperança. Revolta-me o corpo os pensamentos mais altruístas, as minhas mão só podem ser outras mãos num empenho que é meu.

(…) Perco-me pelos meus caminhos. Enormes encruzilhadas que recaem nos meus pensamentos. Direita, esquerda, cima, abaixo, fico-me. Parada recolho o céu que cai sobre mim. Arrepio-me mais uma vez com medo das minhas ilusões. Dos monstros e fantasmas que não me largam. Já estão tão longe, mas sempre tão presentes que tenho medo que sejam reais. Não pode! Nem quero, quero trilhar outras veredas, outras vaidades, outros sentidos que não direcções. Sigo-me, os dedos palmilham-me. Abre-se-me aquele sorriso meio parvo quem não se controla… assusto-me.


(…) Nem sempre reconheço os espaços que me rodeiam. Aquela fragrância de carmim que se esconde envergonhada de tempos em que foi abusada. Choro compulsivamente dentro de mim, da mesma forma que recupero suspiros dos tempos em que o espelho despertava fúrias. Experimento outra vez aqueles pequenos corrupios –, entre o absolutamente e o delicadamente carnal. A pele eriça-se, protejo-me de olhares mais perversos – os meus próprios olhares. A minha orbita volta a céus onde a musica suporta todo o desejo daquele caminho percorrido tantas vezes…


(…) Levanto-me, ergo-me mais uma vez perante o meu corpo. Está nu. Nada me separa de nada. Sinto vozes, que vociferam palavras de deleite. São armas que entram por mim e me descontrolam. As minhas mãos interpretam sinfonias, verdadeiros solos de poesia. Contorço-me, fecho-me, antes de me abrir e sentir o descolar da minha alma. Arremesso-me de encontro aos meus segredos. Tremo sem medo. A espinha contorce-se de uma vontade ir sem nunca chegar. Há um percurso que se vê ao longe e tenta-se perpetuar no momento. Ingrata a missão entre o querer e o ter, sabendo-se que se vai chegar. – Mesmo que sozinho.


Apeteceu-me

" Uma Mulher é sempre Mulher mesmo na desgraça, um Homem é sempre uma desgraça perante o seu olhar". Charles de la Folie

terça-feira, outubro 09, 2007

Espaços

(…) Aquele acordar de manhã, arrepiava-me. Tinha saudades de quando me tocavas. Não percebi a tua partida. Deixaste-me para sempre aqui envolta nos meus lençóis –, num despertar agoniante. Tento aguentar-me mais um dia, mais um dia que aparece e desaparece em mim. O meu corpo começa a degradar-se, sem a tua sábia oração a ele. Toco-me, não é a mesma coisa. Sinto-me em mim, gosto sobre maneira. Mas falta-me o teu arfar, aquela lufada que me percorria num sonho de carícias.




(…) Já não me lembro, do dia em que foi. Olhei-me ao espelho depois de me levantar. – Não me reconheci. Estava velha. Pior, senti-me velha, envelhecida na minha própria imagem. Despi-me como quem se despede. Puxei a cortina da banheira –, até me deixar espaço para entrar. Levantei uma perna, apoiando-me em algo que não me lembro- levantei a outra com a agilidade que há muito já não tenho. Sorri, gosto de sorrir. Senti a agua que percorria o chuveiro a embater em mim até acordar.





(…) Gosto do toque do turco. Macio eleve. Leva-me por ai, socorre-me. Tapa-me espaços e brechas que se abrem por ai, no meu corpo. É acutilante. Gosto de me abraçar a ele… ou a ela. Já não sei se por vergonha ou pudor, que não o faço a janela a olhar para longe. Tão longe quanto possível. Apaga a água que há em mim, escorre-a, absorve-a. Um ciúme que me revolta por vezes. Entre a água que gosto de sentir, e aquele que me faz tremer. Gosto de sentir o turco a roçar os limites de mim. É boa aquela sensação.


(…) Andava nos limites de mim mesma. Tinha medo do que ia na minha alma. Nada de especial, coisas de gente menos nova. As varizes já tinham de ser acalmadas, com pequenas massagens. Gostava de as acalmar, acalmava-me depois outras coisas que por vezes estavam esquecidas. Sentia a vontade de as percorrer –, enquanto fechava os olhos. Tinham-me ensinado a nunca desistir. Eu sabia que não podia desistir de mim. Já não havia ninguém a quem recorrer.




(…) Já nada me faz esquecer o passado. Lembro-me que nem tudo foi preenchido. Mesmo assim… duvido que alguém possa ter o que tive. Os cheiros, as imagens, os sons –, estão todos dentro de mim. Muitas vezes, quando me arrepio ao acordar, enrolo-me nos lençóis e deixo-os percorrer… por mim. Sinto-o como senti tantas coisas em mim. Quando saio daqueles banhos, em que a agua me consome o fogo –, a toalha de turco recorda-me as mãos que me pertenceram. Fico feliz, por nunca ter tido uma coisa – a solidão.



Apeteceu-me




"As duvidas que se abatem sobre nós, também nos erguem." Charles de la Folie

terça-feira, setembro 25, 2007

Real vida

(…) Sentia o cheiro, de um lado pinheiros, do outro pequenos molhos de flores silvestres amarelas. Um odor intenso a campo. Seguia num passo certo, não muito rápido mas decidido. Pequenos pássaros saltavam entre arbustos. Do meio da mata vários sons, por entre as folhas secas que se encontram no chão. O corpo sua, vai-se derretendo lentamente. A sua alma eleva-se na busca da sua calma. Sente-se, antes de se corromper. A respiração torna-se mais forte. O peito roça na pequena camisola de alças que lhe cobre o busto.

(…) Entre a terra e a erva, onde os pés se vão cravando conforme segue em frente. Quero percorrer outros caminhos. Ruborizo com os pensamentos que me ocorrem. Aquela aragem, o meu cheiro, a minha vontade e o desejo de ser única naquela paisagem – violam-me a serenidade da ocasião. Baixo-me para apertar o atacador, sinto o suor que desce do abdómen em direcção a mim. Percorre-me como uma leve pena. A respiração torna-se mais profunda.O aroma dos pinheiros penetra-me e entra nos meus pulmões.



(…) Fecho os olhos à procura dos silêncios daquela manhã. Ouço mais uma vez o despertar do meu corpo, o desabrochar dos meus poros que emanam cheiros de volúpia. Preciso de ser apreciada por quem me merece. Parada naquela pequena clareira de avanços e recuos, segue-me o ruído das agulhas caídas dos pinheiros. Respiro fundo. Mãos na zona lombar, olho para cima, estico o tronco. Os peitos sensíveis e duros, o roçar fere. Toco-lhes, percorre-me um irremediável tremor pela espinha.

(…) Poisa uma rola num tronco defronte a mim – observa-me. Sinto-me desejada, fecho os olhos. Sou eu que me desejo. Só que não sei como. Os calções justos, que descem por mim até ao joelho afagam-me e afogam-me os movimentos. Percorro mais uma vez a cúpula das árvores, revejo o céu azul. Ajeito-me dentro de mim, alongo-me em direcção a nada, o corpo cede, range e estala. Invade-me a angústia de me redescobrir na minha imensa solidão.



(…) Concentro-me em mim, no meu eterno e terno desejo. Começo a querer saborear o sal que sai de mim. Perna atrás de perna, sistematicamente em passo de corrida, faz sair ainda mais de mim para fora. Todo o centro de mim roça, em toda a minha sensualidade. Como o galope de um cavalo. O vento faz esvoaçar os meus cabelos que se vão prendendo, quando em vez na boca. Humedeço os lábios secos do cansaço, percorre-me novamente o silêncio do campo. Deixo-me ir em direcção à minha vida real.





Apeteceu-me




" Entre o desejo e o sentimento percorre-nos a realidade muitas vezes cruel". Charles de la Folie

terça-feira, setembro 11, 2007

Imagem brutal

(…) Sentia-me tranquila a pensar em mim. Sentada na borda da minha cama puxava calmamente as minhas meias novas de rede – pretas. Sorria, gostava de o fazer, enquanto tirava partido de mim. Adorava seduzir-me, olhava para o espelho enquanto as puxava. Tinha umas pernas bonitas, brilhantes e bronzeadas. Uns joelhos sem marcas, umas coxas compridas que terminavam nuns quadris carnudos e apetecíveis. Gostava de passar a mãos devagar por elas, senti-las. Nada como fazer jogos de sedução comigo, fazer umas meias percorrer por cima daquela pele sensível e cheia de vontades.










(…) Tinha ao espelho a mesma sensação de quando sou olhada e apetecida - naquele momento fiquei envergonhada. Fixei-me nos meus próprios olhos, embaracei-me comigo. Tinha medo de mim, pensava que me podia negar aos meus belos prazeres. Estava a ser egoísta, preferia-me a ser preferida. A cumplicidade entre o meu espelho, a minha imagem e os meus prazeres assustavam-me, mas não me desanimavam.




(…) Enquanto me olhava, massajava a sola dos meus delicados pés. Eram sensíveis ao toque, havia partes que me faziam humedecer os lábios, me punha desconcertadamente atenta a sinais que me chegavam. Imaginava alguém a percorre-los com a língua, e sentia uma vontade incontornável de me ter. Com a ponta dos dedos sentia os tornozelos, contornava-os até ao peito pé, e massajava toda a parte inferior. Estava em mim o poder de me deslumbrar. Olhava para o espelho e … ali estava parada a espera de um movimento perdido em minha direcção.



(…) Cresci a olhar para mim, mas nem sempre me vi como hoje me vejo – com prazer. Houve tempos em que me odiei… odiei cada passo que dei até me conquistar. Sinto nas pernas o meu peso, como sinto nelas o meu poder de encanto e de poder subornar-me nas alturas em que me odeio. Gosto de passar as mãos de uma forma suave. Percorrer as coxas de uma forma calma e cativante, percorre-las e enganar sítios que me querem e humedecem com a violência de um olhar.



(…) Deixo-me cair para trás na cama. Com as mãos na zona abdominal faço força para conseguir levantar as pernas para cima. Observo-as, contemplo-as, deixo-me levar pela sua beleza. Vejo e revejo-me, dona dos meus próprios destinos, vontades e prazeres. Penso quem sou e quem fui, e desejo desejar-me sem que isso me provoque fúria, ansiedade, desespero, irritação. Dependo de mim para manipular os meus sentimentos e vontades. Olho para a imagem que se deixa reflectir no espelho, e cada vez mais sinto que sou dona de mim do meu corpo. Só eu me poderei magoar.


Apeteceu-me


"Revi ontem a tua imagem, mas só hoje me apercebi como sou". Charles de la Folie

segunda-feira, agosto 27, 2007

ARDENTE (MENTE)



(…) Dentro de mim crescia dia após dia a vontade de partir. Os meus sonhos pareciam ter terminado. Os meus desejos, já não eram. Vivia um pesadelo que aparentemente crescia em mim. Dava por mim prostrada, cabisbaixa, ombros encolhidos, costas quase enxovalhadas como um trapo. Longe iam os dias em que olhava para mim ao espelho e me interrogava… até onde poderia chegar aquele corpo (quase), perfeito.



(…) Havia dias em que o meu pensamento percorria histórias passadas. As minhas seduções (longe vão os tempos) … A verdade é que gosto de me seduzir a mim. Já não tenho muito tempo para me seduzir, arrebatar-me, deslumbrar-me… comigo mesma. Tenho-me, mesmo que enrugada e enlutada por algo que já não funciona. A minha cabeça funciona, os meus sentidos também.





(…) É curioso, como o suor ainda escorre, quando relembro momentos quentes. Muitas vezes passo as mãos por mim, sinto o corpo descaído e abatido… mesmo assim a minha mente (mente-me). Ai, como sinto um leve sopro de mim a repassar a pele a torneá-la. Fico com medo que a morte me leve no meu último fôlego de me reconciliar com o prazer libidinoso.




(…) Não sei onde vou, nem porque vou… muito menos sei se quero ir. Umas vezes penso que já cá não faço nada. Há outras, ai, se há… há outras que começo dentro de mim a desfolhar as minhas memórias e encontro a força imensa para perceber que sou imortal. Gostava agora de ser imoral. Tivesse eu o corpo de outros tempos e despia-me, ia para a rua mostra-lo, fazer inveja a quem tem pudor pela vida e por si.





(…) A verdade dói, custa-me já a levantar todas as manhãs. O meu corpo esta a desfazer-se por dentro. Morre aos poucos como o tempo. O que fui e o que sou! Sinto cada vez mais as paredes a estreitarem-se sobre mim… já não tenho a força de braços que tinha, para as afastar e não me sufocarem. Cerram-se e serram-me o juízo. Tenho vontade e necessidade de permanecer junto aos pequenos perfumes que tento percorrer na minha memória.


(…) Onde estão? Por onde andam as duvidas que me vão percorrendo. Dobro a espinha, na esperança de encontrar entre as minhas pernas o vazio que me pode preencher os dias que me faltam. Faltam me dias!? Espero que não me façam falta, quero ter tudo pronto para quando um dia tiver que ser, fique com a minha conta dos dias saldados. Só um momento, e assusto-me. Arrepio-me de pensar que ela… ai está, pronta para me levar. Não me quero sentir só.




Apeteceu-me

“ Pior que a Morte é sentirmos a espera dela”. Charles de la Folie

terça-feira, julho 31, 2007

Sentido em MIM

(…) Tinha uns olhos brilhantes! Aqueles olhos cintilavam no seu prazer de viver. Cinzentos, cor de nada, ao sol ficavam verdes cor de tudo. Olha-la nos olhos, era como enfrentar um furacão de emoções, descobrir um poço sem fundo de sentimentos. Ternos, um poema eterno para ser cantado ao longo de mil anos. Quando os fechava, tudo à sua volta morria. Mas dentro de si, tudo despertava, sentia no escuro do seu regresso, chegar perto de si o prazer do seu corpo. Os olhos, a sua visão tornava-se numa espiral de monumentais emoções. No seu olhar percorriam-lhe os tremores do desejo do seu desejo. Via-se e revia-se.





(…) Gostava de cheiros. Da sugestão que os cheiros lhe davam. Entravam dentro de si, na sua mente, mais depressa que o ar lhe chega aos pulmões. Vivia mais depressa, a um ritmo sensível que lhe chegava pelo olfacto. Percorria o seu corpo pelo cheiro, sabia, e sabia-se. Aquele cheiro que vinha dentro de si, só de o imaginar molhava-a. Redescobria-se, enquanto respirava fundo, e cada vez mais sentia-o entrar. Odores, quentes, ácidos e doces, que evoluíam dentro de si prontos a sair. As suas narinas fortes, abriam com força, com a mesma vontade que o cheiro do seu prazer… saia de si.






(…) Os sons, que cresciam àsua volta, despertavam-na, a ela e não só. Aquelas músicas, as melodias, que a faziam crescer, percorriam-lhe a alma de cima, a baixo. Os sons do seu corpo a despertarem memórias da sua vontade. O silêncio do seu encanto, a desmentirem que o seu corpo se mantinha desfalecido. Gostava de ouvir o som das cordas do violino a serem rasgadas pela crina do arco, numa supinação infernal. O corpo reagia a esses sons da mesma forma que a um murmúrio, bem junto do ouvido. Onde as pequenas aragens que vão saindo quando são proferidos os sons, as palavras, as frases, põem em duvida a confiança que existe dentro do meu ser. Gosto de ouvir o tilintar da sua tentação.





(…) Quero o sabor dos meus lábios. Quero o sabor a sangue quando os trinco e os lambo. Sentir a minha língua a humedece-los enquanto outros lados se vão transformando em pequenas cascatas de mim. Os sabores do amor, do deleite, do gozo percorrem-me por dentro, transformando-me por fora. Sentir o fresco na minha língua, junto com o calor que vem de fora. Percorre-me por dentro a vontade de sentir o sabor de tudo, de ser ainda mais mulher por me ter e querer. Quero sentir uma vez mais os lábios molhados, humedecidos pelo gozo que me dá vir-me em mim. Por isso… quero o paladar do meu gemer.






(…) Percorro-me, com o suave toque dos meus dedos. Leio-me, concretizo-me, dou-me a conhecer. Percebo que o meu corpo é uma cartilha do meu próprio entusiasmo. Conhecer o meu gozo, e gozar-me. Satisfaço-me, com dois dedos que caminham como duas pequenas pernas… conhecem, montes e vales…deleitam-se em poços onde a esperança nasceu. Apalpam as melodias que sugerem a beleza que se encontram numas pernas há muito poupadas de outros sofrimentos. Sinto outros amores, gosto de entrelaçar os dedos em pequenas florestas que me fazem sonhar. Sentir na ponta dos meus dedos o meu fundo que me faz saltar e soltar os gritos da minha libertação.








Apeteceu-me





" Nem sempre percorrer é chegar, por vezes é o caminho mais longo para nos conhecer". Charles de la Folie

terça-feira, julho 10, 2007

AMANTE

(…) Olhava-o nos olhos, fixava-os. – Eram doces como o mel, calmos como o prado, tranquilos como a tua imagem quando se reflecte em ti. Passava-lhe com a mão no pescoço, sentia a sua respiração, forte e quente perto do meu rosto. Sentia-me assustada sempre que estava diante dele, mas sentia-me mais que nunca, sentia o prazer do momento, de cada pedaço daquele instante. Estremecia só de o pensar.

(…) Gostava daquele ritual, não me sentia uma amante apesar de ser de outro. Eram diferentes, um a liberdade, outro a escolha que foi feita em tempos de paixão. Fitei-o novamente nos olhos, num movimento seguido senti o seu aproximar – a sua boca roça-me a cara. Ternamente toquei-lhe, juntei-o, e deixei-o estar junto a mim durante alguns segundos. Passei-lhe com a mão ao longo dele.

(…) Houve tempos em que tive medo, muito medo, estava presa em mim. Os gestos de liberdade fugiam-me, não que os não soubesse utilizar. Estava petrificada no meu mundo, na minha maneira de ser. Tive medo de ter perdido a mulher que existia dentro da minha alma, em que corria, lado a lado com os meus pensamentos mais incómodos e libertinos. – Não para mim, mas para eles que não se libertam do bom que a vida nos proporciona.

(…) Ali estava eu com ele, liberta de mim e em mim. Sabia-o desde sempre que ali, conseguia sentir o que mais ninguém conseguia fazer-me alcançar. Retirou o lenço dos seus longos cabelos ruivos, arregaçou as mangas da sua camisa de bombazina rosa, olhou-o mais uma vez nos olhos, sentiu-o ainda mais calmo. Abriu a porta, uma longa porta de madeira tratada, presa por duas enormes dobradiças de ferro. Um fecho de ferro forjado, bem oleado para não emperrar em situações mais complicadas.

(…) Era um bonito alazão, de um tom de ouro avermelhado. Uma enorme crina cor de palha dourada. A sua cauda também, palha dourada, muito bem penteada e arranjada. Olhando para ele, não se dava conta que descendia de uma linha evolutiva de sessenta milhões de anos. Lentamente punha-lhe o arreio, calmamente colocava-lhe um freio que não o ferisse na boca, tal era a confiança e a empatia que existia entre nós.



(…) Enquanto lhe fazia festas no dorso, colocava-lhe uma manta, para depois lhe colocar a minha pequena sela de couro, um couro muito suave com um toque muito especial. Ali estava eu, sentindo a sua disposição para lhe apertar a sela junto à barriga, e ajustava os estribos. Estava pronta para a minha viagem. Entre nós não havia mais nada, nem esporas, nem chicotes, éramos só os dois em direcção a liberdade.

(…) Tomava-lhe as rédeas e partíamos, para os campos junto ao rio, onde o gado costuma pastar, gostava de ver o rio descer. Dava-lhe a liberdade de me tomar. Dava-lhe rédea solta, e galopava, num galope solto e continuo… a minha sela sentia-me tocar-lhe passo sim passo não, era um sobe e desce constante. O corpo começava a ceder, o cheiro do campo entrava pela alma. Os gritos de prazer tornavam-se constantes.

(…) O seu corpo começava a derreter-se. No sobe e desce do galope, os seios iam crescendo ao roçarem-se na sua camisa. O vento batia-lhe no rosto. Olhos abertos cheios que lhe percorriam a face, provocadas pela emoção de se sentir livre e em perfeita harmonia com o seu corpo. Tinha-se e vinha-se num percurso que só aquele alazão de olhos doces como o mel ,lhe sabia provocar.

Apeteceu-me

"Gosto de percorrer caminhos diferentes, com o objectivo de voltar a percorrer outro diferente em dias iguais". Charles de la Folie