quinta-feira, março 03, 2005

Game Over

Game Over

(...) A adrenalina subia, as mãos estavam trémulas, mas a verdade é que ele sabia que era possível, que naquele dia, poderia mudar a sua vida para sempre.
Estava nervoso sim, mas tudo porque tinha mentido a sua miúda, uma mentira descabida, despropositada, daquelas mentiras que soam a falso, que transpiram hipocrisia, ele sabia-o estava arrependido naquele momento, mas sabia que tinha deixado para trás uma imensa angustia a alguém.
Mas a verdade é que agora estava frente a frente com a maquina, aquela maquina tinha corrido o mundo, uma maquina de Flippers, de dois pisos, bem antiga mas que tinha um objectivo, bater aquele recorde, 1 milhão e 1, isso mesmo se batesse aquele recorde de 1 milhão e 1, ele alem da notoriedade, ganharia uma avultada soma em dinheiro, que daria para realizar o seu sonho, o sonho da sua curta vida uma casa com piscina.
De costas voltadas, para aquele jogo, que mais não era que a luta do homem, não pela sobrevivência, mas contra o plano inclinado, era impressionante o tempo que tinha que se aguentar a bola, ali em cima sem entrar em lado nenhum que fosse irreversível, mas de costas voltadas conseguia ver mentalmente todos os obstáculos da mesa de Flippers,
todos os pinos, sabia-os de cor, sabia onde devia colocar aquela enorme esfera de metal, todos os movimentos, continuava a mentalmente a percorrer cada canto, como se contornasse o corpo de uma mulher.
Ele queria que aquele momento fosse único, mas para o ser não deveria ter tido aquele acto irreflectido com a sua miúda, a sua adorada miúda, mas já estava feito e desistir, não fazia sentido, não naquele momento, virou-se, frente a frente com aquele plano inclinado, fixou-o, foi como uma espiral, os seus olhos sugaram toda a parte útil da maquina, ficaram em perfeita simbiose sem tirar os olhos, daquele vidro, onde por baixo figuravam imagens de inúmeras cobras de todas as forma e feitios, meteu a mão no êmbolo que ficava no seu lado direito, com os dedos sentiu os botões que comandavam os Flippers, lentamente puxou o êmbolo, sentiu a força da mola que lançava a bola, aquela imensa e pesada bola de metal, não puxou mais que metade do que podia, meia força, servia meia força, para a bola subir, até ao inicio do jogo, tinha direito a 3 bola, 3 bolas para conseguir bater aquele recorde que durava desde o primeiro dia da maquina, 1 milhão e 1.
A bola foi lançada, antes pensou só uma única vez na sua miúda, quem o observava susteve a respiração, sabiam que podia estar a testemunhar algo de espantoso, poderia durar horas, mas ele sabia os sítios exactos para a maquina dar pontos muitos pontos, sabia todos os túneis vielas, pontes pontinhas, onde dobrava a pontuação, onde ganhava milhares de pontos de bónus.
A bola subiu, foi alojar-se numa das 3 portinholas abertas, acendeu uma luz, ao fim de 3 luzes acesa a pontuação dobrava, e assim sucessivamente, de cada lado tinha dois batentes quando a bola batia saia de lá com toda a força, fosse qual fosse a posição, era automaticamente repelida, os pontos iam somando, ali logo de cada lado havia uma fila de 5 pinos amarelos de um lado e verde escuros do outro, de um lado faltava derrubar um do outro dos verde 3 eram das pontas tornavam-se mais difíceis tinha de dar com a bola na pontinha de um para ganhar efeito e derrubar o outro como se fosse bilhar.
Os pontos iam-se acumulando, já estava a quintuplicar, os bónus eram muitos, ele sabia o limite da maquina, sabia até onde a podia abanar, até ela fazer TILT e perder tudo o que tinha conquistado a bola veio disparada lá de cima e foi alojar-se numa das saídas laterais, ainda tentou com uma palmada seca no lado onde a bola, a esfera, saiu mas não conseguiu, pela primeira vez olhou para cima, viu o contador a rolar, pontos e mais pontos, conseguiu uma bola extra e 2 jogos novos só nesta jogada, mas os jogos não contavam, a bola extra dava muito jeito, o seu rosto já libertava suor, muito suor, escorria-lhe pela face caia-lhe nos olhos que lhe fazia arder, de vez enquanto piscava-os, mas passava-lhe rápido a concentração voltava depressa, no fim da primeira bola ele já tinha conquistado a sua maquina 70 mil pontos e uma bola extra além dos bónus, preparava-se para a segunda, com o seu ar circunspecto, concentrava-se, ouvia o que a maquina lhe tinha para dizer, pensava mais uma vez na sua miúda, soltava a t-shirt das calças, puxava as mangas para cima dos ombros o mais possivel, a segunda bola era lançada (...)
Já só sobrava uma bola, tinha conquistado 6 bolas extras e um sem fim de jogos, esta era a ultima era a décima era a bola que ia decidir tudo, já só faltavam 60 mil pontos para o milhão e 1, ele sabia que era decisiva, que estava ali o seu sonho tão perto de o alcançar, olhou mais uma vez para a pontuação, fechou-se entre ele e a maquina, puxou mais uma vez o êmbolo, a bola saiu enroscada, como queria, foi precisamente onde mais, já só faltavam 45 mil pontos, e sucediam-se jogadas de cortar a respiração, a bola parecia vir direitinha ao meio com um pancada ao de leve a bola mudou de direcção, quando parecia que ir dar com força para a bola seguir o mais possível para cima para aquele plano inclinado, o flipper ficou imóvel, a bola bateu e saltou para o outro e numa jogada de mestre derrubou o 3 pinos que faltavam, estava a 5 mil pontos do milhão e 1, naquele momento sentiu um cheiro doce, um cheiro que conhecia a muito era o cheiro da sua miúda, um cheiro que lhe dava um enorme bem estar, uma enorme vontade de gritar, estava a um pequeno passo de um beijo e de grande feito, parou a bola no flipper, olhou, então para ela recebeu um sorriso, um sorriso de tranquilidade, olhou para o contador, viu o que faltava, jogou a bola, o recorde estava quase ali, quando a sua miúda de um só gesto, desligou a ficha. Game Over .

Apeteceu-me

"Where did you sleep last night" dos Nirvana acompanha-me constantemente, é a musica que eu costumo trautear quando preciso de sorrir e quando tenho de "renascer das cinzas lembro-me de um reclame da Pepsi...a letra é mais ou menos isto(...) tenta conseguir o que julgas melhor anda para a frente e lá chegarás, junta-te (...) o segredo de vencer...lálálá tem pelo menos 22 anos.

8 comentários:

isa xana disse...

ADOREI!!! li sem parar, só satisfeita quando cheguei ao fim. adorei o final, ri-me, gostei mesmo do final.
mas acho que poderias ter colocado outro titulo para so no final sabermos se ele ganhou ou nao.. q achas?

epa, adorei mesmo!!

beijo

Anónimo disse...

Epa, que ganda desilusão..quase lá e de repente game over?ai mãe, isso não se faz mm...o feito ele não conseguiu, mas será que recebeu o beijo?!? ;)...está demais Charles..adorei..fica bem
beijos

Cris disse...

Adrenalina...suspense!
Como todos os adolescentes, tb joguei flippers... claro que nunca batia records nenhuns a n ser na baixa q os meus bolsos soriam... mas lembro-me bem do gozo q aquilo dava... e da magia das luzes sempre q conseguia uma bola extra ou uma terminação...

Agora vamos ao q interessa... a mentira à miúda tinha um propósito... concretizar um sonho no qual ela teria, concerteza um lugar enorme já guardado...
O q o terá motivado a esconder o q ia fazer?... receio q ela n concordasse ou, simplesmente, o prazer da emoção de lhe fazer uma surpresa?...

Onde está a culpa? Nele, q n foi completamente honesto... ou nela, que n acreditava nos sonhos dele nem tão pouco lhe permitia atrasar de algum modo o seu "crescer"?

Não sei... mas foram todas estas interrogações q encontrei no teu texto... com a certeza q ele, ainda sentiu remorsos... mas ela nem sequer parou para pensar...

Dream Over...

Anónimo disse...

game over, ganhou o amor...
muito bom, entusiasmei-me de tal maneira que me ia esquecendo de respirar...

Micas disse...

Adorei. Quase ficava sem respiração a ler o texto e no fim...moral da história:a mentira não compensa ;) Também gosto muito dessa música dos Nirvana :) Beijos

D disse...

Hey ja tava aqui tao coladinha, para depois chegar ao fim e dizer GAME OVER:p
textos aliciantes + entusiasmantes + feitos por ti = não passar um dia sem vir ao teu blog**

mabeka disse...

A mentira não compensa. É bem mais compensador defendermos os nosssos sonhos e partilha-los com quem amamos, se bem que por vezes bem dificil.
Gostei bastante do texto.

António Balbino Caldeira disse...

Grato pela visita. Não conhecia, mas virei mais vezes. Parece-me um blogue de muita qualidade.

Vou linkar.