quarta-feira, março 02, 2005

O Jogo (de um dia)

O Jogo (de um dia)



(...) Que mais se podia pedir, o ambiente era fantástico, quando anunciaram a constituição da equipa, mais de 50 mil pessoas a gritar pelo meu nome, era um jogo especial do tudo ou nada, quem vencesse seria campeão o sonho de uma vida, o sonho que não estava ao alcance de todos e, naquela altura naquele momento estava ao meu alcance, olhava em redor das bancadas, mil cores, mil sons, mil cânticos, mil diferenças, muitas mil, para apreciar sentir, mas tudo começou, lá dentro lá em baixo no balneário.
Depois de sair da camioneta, ou autocarro ou raio que lhe chamam, calmamente e com os phones nos ouvidos concentrava-me, olhar vazio, vago mesmo a espera de outras entradas, de outras regras, ouvia uma musica da américa do sul com Flauta Pan, para ai “o condor pasa”, não podia precisar naquele momento, naqueles minutos já muitas emoções tinham passado por mim, mas seguramente era musica que eu gostava.
Quando entrei no balneário, a adrenalina subiu, como subia em todos os jogos aquele cheiro, um misto, de pomadas, pomadinhas, mezinhas e bálsamos, um cheiro intenso, que fazia, os níveis de confiança aumentarem, sentei-me no meu lugar onde estava o meu equipamento pronto a ser utilizado, novinho, como sempre naqueles grandes jogos, adorava o meu numero, o numero que me acompanhou uma vida, o dia em que nasci era um numero magico para mim, sentei-me ali, ouvia o burburinho dos meus colegas, as sucessivas tentativas de concentração, baixei a cabeça de uma forma calma, retirei de uma das bolsas do meu saco uma pequena pedra, um seixo que tinha um dia apanhado numa praia, que tinha ido com o meu pai, guardei-a e tornou-se o meu talismã esse era um dos talismãs, o outro era uma bíblia muito antiga, que me fora oferecida pela minha avó e que me recusei sempre a abri-la, desde o dia em morreu.
Mas ali de cabeça baixa, segurava a minha pedra, e murmurava, balbuciava pequenas cantilenas de infância, o barulho começava, os pítons das botas a roçarem pelo chão começavam a enervar-me, minto aquele barulho chamava-se nervos, os nervos que se apoderam de qualquer jogador antes de um jogo, não de um grande jogo, mas de um qualquer jogo.
O treinador, falava comigo, a sua voz parecia distorcida, foi ficando melhor, mais nítida consoante a minha atenção, o meu actual mundo, o meu estado, começava a prender-se a ele, naquele momento já sabia que poderia fazer história, que poderia decidir a alegria de milhões, mas também poderia ser a causa de uma enorme e frustrante tristeza de muitos, muitos mesmo seguidores.
O ritual do balneário começava quase a compor-se, eram as ultimas massagens, os últimos produtos, as ultimas ligaduras, eu por exemplo ligava sempre o pé esquerdo de forma a ter mais pressão, a senti-lo melhor, a ficar mais rijo, e a não se dobrar tanto, sabia que no final teria de ficar pelo menos mais 1 hora que os outros, para fazer gelo, para o desinchar. Estava quase na hora, faltavam poucos minutos, estiquei os braços para vestir a camisola, ela deslizou tranquilamente até bater nos ombros, ajeitei-a puxei os calções para cima, meti a camisola para dentro, depois olhei para as minhas botas de futebol, eram brancas a estrear feitas a medida, pítons de alumínio para rasgarem a terra a relva, por vezes corpos, mas sem maldade, tempo para um grito quase tribal, que fazíamos em grupo para aliviar e deitar fora toda a tensão, batíamos violentamente com os pés no chão, faltavam poucos metros para o relvado, para o jogo, para uma vida.
E ali estava eu, perfilado a ouvir cânticos, a ouvir-me por dentro e por fora, sabia que poderia ser a chave, os adeptos também depositavam toda a confiança em mim, na minha pessoa, os jornais não paravam de dizer e de falar nisso, mas não me importava, convenci-me que era só mais um jogo, apesar de o querer ganhar muito a minha vida não dependia disso, a minha vida dependia de outras coisas mais importante, muito mais importantes que isso, a minha vida dependia da minhas “pipocas” e dos meus sonhos.
Estava na hora, cumprimentei, aliás saudamos todos os nossos adversários, o arbitro, perfilamo-nos pelo campo, olhei mais uma vez a minha volta, vi aquele espectáculo de luz, de cor, de sons.
Sustive a respiração, o arbitro, meteu o apito a boca e foi naquela altura, que o carro de trás apitou, o semáforo estava verde, a botas de futebol penduradas no espelho retrovisor, pareciam acenar para mim.

Apeteceu-me

9 comentários:

Anónimo disse...

eehehehe paragens no meio do
transito dão cada "viagem"...::)) esta está fabulosa!
As minhas são mais em altura ou profundidade.
Mar ou sobrevoanço de planetas malucos::))
Cada loko - cada viagem !!!

Anónimo disse...

a anónima é a Maria... não consegui voar sobre o teu ninho de cucos

D disse...

A sensação de jogar em grandes estádios,com grandes claques e uma enorme felicidade em fazer o que se gosta.
É incrível como nos "transportas" tão bem para essa realidade,através do ecrã do computador.
Isso já não é talento... é um dom!
:) beijinhos * *

Anónimo disse...

O sonho comanda a vida!!! Charles terá sido um derby lisboeta da 2ªcircular? e quem terá ganho?...raio do semaforo abriu antes de tempo rsrsrsr...mas as emoções de que falas, devem ser mm aquelas que eles sentem antes de qq jogo, de um grande jogo..adorei como sempre...fica bem
beijos

Anónimo disse...

futebol é uma paixão, mais uma vez vivia com o teu texto. é tão bom sonhar acordado.

Cris disse...

Olá...(engraçado, ia agora tratar-te pelo teu nome mas acho q n o retive, desculpa. Para a próxima tenho a certeza q vou lembrar!)

Cheguei aqui de paraquedas e pensei tratar-se de mais um blog de opinião. Não que tenha alguma coisa contra blogs de opinião, apenas q, como tratam da actualidade, acabam por versar quase todos sobre os mesmos assuntos. Ia pois já a dar meia volta quando ouvi a tua voz a lembrar-me q estava na República dos Pêssegos... já tinha reparado no nome do blog mas com uma voz tão firme soou-me ainda melhor... e resolvi dar uma olhada aos textos...
Foi nesta altura q percebi o q teria perdido se, simplesmente, tivesse dado meia volta...

Li este teu sonhar acordado de uma ponta à outra, com o fascínio de quem leu um sonhador.

N me surpreendeu a qualidade da escrita ( sim, porque muito embora n tenha reparado no teu nome, reparei q eras jornalista... talvez daí a a ideia primeira de encontrar um blog de opinião.)
O que eu n contava mesmo era encontrar um jornalista a contar um sonho que nos fala de "sonhos"... assumidos!

Agora vou ali atrás ver o teu nome para n cometer a mesma gaffe da próxima vez e, caso não te importes, vou linkar-te no meu blog da sapo (Sementes...) porque (confesso a minha ignorância!) n o sei fazer no meu blog da blogger!

Beijinho

Anónimo disse...

espero que a mãe ou as mães dos teus filhos usufrua noutro lado

Anónimo disse...

espero que a mãe ou as mães dos teus filhos usufrua noutro lado

Anónimo disse...

espero que a mãe ou mães dos teus filhos usufruam noutro lado